sexta-feira, 28 de junho de 2019
terça-feira, 25 de junho de 2019
Demissões de jornalistas, macarthismo e Bolsonaro
quarta-feira, 12 de junho de 2019
O pior de tudo é que a novela Neymar/Najila ainda não terminou
Começou no dia 1º de junho. Foi quando a mídia descobriu que a modelo Najila Trindade havia registrado, na véspera, um BO contra Neymar por estupro.
A mídia enlouqueceu. Foi uma correria. Só se falava nisso. Você ia na padaria. O assunto era Neymar. Você estava em um enterro. Alguém se aproximava respeitosamente e dizia, sussurrando: "E o Neymar, hein?" Na TV, nas rádios, na internet, nos malditos grupos de WhatsApp só se falava disso.
O pior é que essa novela talvez seja daquelas longas, intermináveis, insuportáveis. Amanhã, 13 de junho, lá vai Neymar novamente prestar depoimento, passando pelo corredor polonês de milhares de repórteres, câmeras, policiais, seguranças, fãs, curiosos, helicópteros, carros comuns, carros blindados, viaturas. Um pandemônio.
A história começa romanticamente no Sofitel Paris Arc de Triomphe - hotel cinco estrelas, na rue Beaujon, com a diária mais baixa custando a bagatela de R$ 1.800,00. Após breve troca de mensagens pelo aplicativo Instagram, Najila chega ao hotel para ter um encontro sexual com seu ídolo.
O que aconteceu naquela noite ninguém saberá dizer. Apenas os dois. E os dois têm versões diferentes. Então...Pobres de nós, mortais...
Najila retorna ao Brasil. Espera passar 15 dias. Contrata o advogado José Edgar Bueno e diz que foi vítima de agressão. O advogado assume a causa, mas fica pouco tempo no "cargo". Quando descobre que ela havia feito um BO por estupro, decide pular fora do barco Najila.
Najila concede uma entrevista exclusiva ao bom repórter Roberto Cabrini, do SBT. Para não ficar atrás, a Globo divulga imagens inéditas, gravadas no hotel.
Aí, para a novela não perder o pique, a gente assiste estupefato um vídeo da Najila descendo o braço em Neymar. O infeliz está deitado na luxuosa cama do Sofitel Paris, levando bordoada atrás de bordoada. Completamente vestido e de boné, ele põe os pés calçados com um tênis chique para cima, enquanto a moça desce porrada nele.
Najila afirmava que tinha um vídeo que comprovava tudo: as agressões e o estupro que teria sofrido de Neymar. O advogado pede o vídeo. Ela diz que a prova está em um tablet.
Ela vai prestar depoimento na polícia. Tem um piripaque. Desmaia e sai carregada pelo advogado, em uma cena que somente o nosso noveleiro preferido, Walcyr Carrasco, conseguiria imaginar.
Correndo por fora, a mídia trazia a cada hora uma novidade. Ficamos sabendo, em um capítulo, que Najila estava sendo despejada de seu apartamento e que não havia pago um curso na Escola Panamericana de Arte e Design. Devia, por baixo, uns R$ 30 mil.
Outro dia, outro capítulo: descobrimos que Najila havia esfaqueado o ex-marido, Estiven Alves. Em entrevista, Estiven confirmou a facada: "Foi no peito. Eu me internei". Tinha até BO.
Para se defender, Neymar publicava as mensagens que havia trocado com a modelo. Mostrava fotos dela, em posições sensuais.
O cantor pagodeiro Zula jurava que não queria se promover, mas comemorava que seu vídeo Fogo Cruzado, até então obscuro e poucos visto, com a participação de uma seminua Najila, estava bombando na internet, com 1 milhão e 600 mil visualizações.
Nessa altura da novela Neymar/Najila, o advogado monarquista abandona o caso, argumentando que ela não havia entregado o tablet com as provas. Pior: Najila dizia que quem tinha surrupiado o tablet havia sido o advogado.
Najila garante que o tablet foi roubado. O condomínio onde ela mora diz que não houve roubo nenhum e o porteiro do prédio - pra variar - registra um BO contra a modelo por ameaça e intimidação. A polícia vai até o local e tira impressões digitais. Só aparecem duas impressões: a da própria Najila e de uma empregada. Najila, por seu turno, acusa a polícia, dizendo que foi todo mundo comprado.
Durma-se com um barulho desses!
segunda-feira, 10 de junho de 2019
Eu já sabia, Intercept
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Deltan Dallagnol |
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Sergio Moro |
Foi um grande furo de reportagem. O site The Intercept Brasil, credenciado pelo premiado jornalista norte-americano Glenn Greenwald, publicou neste domingo, 9 de junho, uma matéria especial, dizendo tudo aquilo que a gente já sabia, mas não tinha como provar. Greenwald conquistou fama mundial ao divulgar, no The Guardian, os documentos vazados por Edward Snowden.
O que a gente já sabia? Que o juiz Sergio Moro e os promotores da Lava Jato trabalhavam em sintonia fina. Moro lançava a bola. O promotor Deltan Dallagnol matava no peito e fazia o gol. Dallagnol fazia um lançamento de 60 metros, em profundidade, deixando Moro na frente do gol para marcar mais um.
No caso, não se tratava de futebol. Era a incansável labuta da Lava Jato em conseguir provas que conseguissem mandar para a cadeia os principais integrantes do Partido dos Trabalhadores, entre eles, o principal "inimigo" o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Com toda essa sinergia entre juiz e promotores, o processo foi bem-sucedido. Lula foi julgado e condenado, por causa de um apartamento no Guarujá, no qual ele nunca morou, nem nunca foi dele (o próprio Dallagnol dizia: "tô com receio da história do apto".). E também em razão de um sítio, de propriedade do empresário Fernando Bittar (https://www1.folha.uol.com.br/poder/2019/04/dono-do-sitio-de-atibaia-pede-a-justica-para-vender-imovel.shtml) .
O objetivo da Lava Jato - segundo o site - era óbvio: tirar Lula da disputa presidencial e limpar o caminho para o então candidato Jair Bolsonaro:
"A Lava Jato foi a saga investigativa que levou à prisão o ex-presidente Lula no último ano. Uma vez sentenciado por Sergio Moro, sua condenação foi rapidamente confirmada em segunda instância, o tornando inelegível no momento em que todas as pesquisas mostravam que Lula – que terminou o segundo mandato, em 2010, com 87% de aprovação – liderava a corrida eleitoral de 2018. Sua exclusão da eleição, baseada na decisão de Moro, foi uma peça-chave para abrir um caminho para a vitória de Bolsonaro".
Assim que foi eleito, Bolsonaro "pagou a dívida" de campanha e indicou Moro para o Ministério da Justiça.
Todo esse imbróglio jurídico está repleto de irregularidades. É de conhecimento comum que um juiz não pode se misturar com a acusação. Está previsto na Constituição brasileira. O artigo 95 diz claramente que é "vedado ao juiz participação em processo".
O juiz deveria ser imparcial. Na prática, a gente percebe que aconteceu o inverso. Moro estava mergulhado até o tutano em uma missão estratégica, que visava colher provas, obter confissões e condenar.
Questionado a respeito, Moro sempre refutou essa hipótese. Cansou de dizer que não tinha estratégia, que quem investigava e decidia o que fazer era o Ministério Público.
Na realidade, Moro aconselha, cobra, questiona, repreende, se intromete, pede para que as investigações sejam apressadas. É uma tabelinha estilo Pelé/Coutinho. Moro passa para Dallagnol, Dallagnol devolve para Moro, Moro para Dallagnol...É gol!
Qual é a base para se comprovar essa relação ilícita entre acusador e julgador? São as conversas, feitas em aplicativos, entre Moro e os promotores da Lava Jato. Um hacker interceptou esses arquivos secretos e os encaminhou ao site The Intercept, que os publicou. Houve um crime. Os arquivos secretos não poderiam ter sido interceptados. O hacker agiu de forma criminosa.
O crime, no entanto, não foi cometido pelo site. O artigo 5º da Constituição brasileira, em seu parágrafo 14, deixa claro que "é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional". Os arquivos secretos foram entregues ao site, que os publicou, amparado no que diz a Constituição.
A ampla reportagem do The Intercept traz ainda informações sobre o famoso tríplex, atribuído a Lula pela Lava Jato. Em seu Imposto de Renda, Lula afirmava ter participação em uma cooperativa habitacional no Guarujá, desde maio de 2005, tendo pago até aquele momento R$ 47 mil. Ocorre que não era um tríplex, mas uma unidade simples, que ficaria na torre B.
Uma reportagem do jornal O Globo, publicada em 2010, mencionava que o casal Lula e Letícia perderiam a vista para o mar, em razão da construção de uma outra torre. A torre A.
Segundo The Intercept, a denúncia da Lava Jato tinha inconsistências:
"Na denúncia feita pela Lava Jato, no entanto, os procuradores afirmam que o triplex de Lula fica na torre A, que ainda não existia quando a reportagem (do Globo) foi publicada. Mas, no item 191 da denúncia assinada pelos 14 procuradores, há o seguinte trecho (citando a reportagem do Globo): 'Essa matéria dava conta de que o então Presidente LULA e MARISA LETÍCIA seriam contemplados com uma cobertura triplex, com vista para o mar, no referido empreendimento'".
Ou seja, a denúncia estava errada. Era outro apartamento. E não o tríplex.
Esse envolvimento entre o acusador e o julgador é ilegal. Não poderia ter ocorrido. Por causa disso, a Lava Jato deve ser descartada? Não. A Lava Jato conseguiu algo inédito na história do País. Conseguiu 244 condenações contra 159 pessoas. Contabilizou R$ 6,4 bilhões em pagamentos de propinas. Veja o invejável resultado da Lava Jato até hoje: http://www.mpf.mp.br/grandes-casos/caso-lava-jato/atuacao-na-1a-instancia/parana/resultado
O público sente simpatia pelo ex-presidente Lula. É inegável que ele fez dois mandatos excepcionais à frente do Brasil. A aprovação popular era ampla e quase irrestrita. Tanto assim que ele foi reeleito três vezes. Uma vez, por ele mesmo. Nas outras, duas "incorporando" Dilma Roussef.
É inaceitável o PT ter se envolvido em tantos casos de corrupção, entre eles, o Mensalão e o Petrolão. O PT tinha a obrigação de ser um partido diferente e não ter incorrido nos mesmos desmandos dos partidos tradicionais. Foi uma pena. Uma traição àqueles que acreditavam no símbolo da estrela, que colavam os adesivos do partido nas janelas de suas casas e ostentavam com orgulho o broche do partido no peito.
Lula será solto? Valerá votar novamente nele, sabendo que o fantasma da corrupção petista irá acompanhá-lo?
Quando o PT vai pedir desculpas a seus eleitores? Quando o partido passará por um rebranding ético e moral?
Moro será despojado de seu Ministério? Moro deu adeus à sua vaga no Supremo?
Essas perguntas serão respondidas nos próximos dias ou meses. O que interessa agora é passar o País a limpo, algo que parece cada vez mais distante e improvável.
terça-feira, 4 de junho de 2019
Viagens de motocicleta
Sonhei com a minha tia. Ela usava um vestido azul (não me lembro na vida
real de tê-la visto com esse vestido; no dia a dia, ela raramente usava vestido).
Estava no fundo de uma sala ou salão. Abriu os braços e nos abraçamos
emocionados. Eu e ela dizíamos: “Que saudades! Que saudades!”. Minha tia morreu
há muito tempo. Câncer.
Gostava muito da minha
tia. Ela tinha uma biblioteca limitada, com algumas coleções (Érico Veríssimo, Monteiro
Lobato, José de Alencar). Os livros, que eu mais gostava, estavam lá no alto.
Na parte proibida para menores. Foi naquela prateleira superior que encontrei O Poço da Solidão, de Radcliffe Hall.
Edição de 1951 da Livraria José Olympio Editora, tradução de José Geraldo
Vieira e uma nota explicativa de Havelock Ellis.
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A autora de O Poço da Solidão, Radcliffe Hall |
Também na parte de cima da prateleira, minha tia colocara os livros de
Harold Robbins, com tradução de Nelson Rodrigues; Henry Miller (Sexus) e, por uma questão de
nacionalidade talvez, Ernest Hemingway (Por
Quem os Sinos Dobram).
Spoonhandle, de Ruth Moore, tinha a capa
azul dilacerada, presa por uma fita adesiva. Na tradução em português,
chamava-se Capitão do Cabo da Colher.
Foi o meu grande livro da adolescência. O futuro estava todo lá: a luta pela
preservação, os gananciosos de sempre, os predadores, os parentes ligados à
escória.
Spoonhandle contava a história de uma colônia de pescadores no Maine e como o lugar ia ser ameaçado pela especulação imobiliária. Dois irmãos pescadores tentavam manter o lugar intacto, enquanto um terceiro irmão, gordo e burocrata, queria fazer dinheiro, matando a natureza. A cena em que o irmão pescador dá um tapa na cara do gordinho é deliciosa. Ruth Moore fez sucesso nos anos 50. Frequentou a lista dos mais vendidos do New York Times. Tentei inúmeras vezes descobrir seu endereço, mas não obtive sucesso. Queria escrever uma carta para ela, falando o quão importante tinha sido seu livro para mim.
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Ruth Moore, autora de Spoonhandle |
Em 1986, citei Ruth Moore, durante um curso na Fairleigh Dickinson, em Nova York, e os professores não sabiam de quem se tratava (talvez isso explique por que a universidade fosse considerada, anos depois, uma das piores dos EUA). A carta nunca foi escrita. Com o advento da internet, soube que Ruth Moore havia falecido em 1989.
Freud
estava certo. Os sonhos são a realização de um desejo. O problema é que eles
são atravessados, veem na forma de reflexo do inconsciente. São tortos,
caleidoscópicos. É difícil interpretá-los. Por isso, as pessoas procuram ajuda.
Contam seus sonhos para alguém de fora, que ouve, anota e mata a charada.
Li toda a obra de Freud
(inclusive a correspondência), por isso, às vezes, consigo decifrar meus
sonhos. Sonhei com a minha tia na véspera do aniversário da minha mãe. Obviamente,
teria que ligar para ela, cumprimentando-a pelos quase 100 anos de vida.
Minha mãe teve uma
tarefa difícil na vida, que foi me ter como filho. Aos 17 anos, pus uma mochila
nas costas e fui de carona até o Rio Grande do Sul. Meu cabelo era comprido.
Usava jeans surrados e lia Demian, de Hermann
Hesse, leitura obrigatória de todo mochileiro da época.
Lembro de chegar na
Lagoa da Conceição, em Florianópolis, e me deparar com uma beleza natural de
perder a fala. Caminhava pelas dunas de areia branca, a lagoa limpa e
transparente ao fundo, aqui e ali, barraquinhas de ambulantes, vendendo
camarões rosa gigantes fritos.
Caminhei pela ponte
Hercílio Luz (hoje, ameaçada de desabar, incapaz de se sustentar por conta
própria). Encontrei outros mochileiros na ilha. Florianópolis, na época, era
uma cidade pequena, acolhedora, repleta de verde e sombra.
Anos depois, retornei a
Floriá e não reconheci mais a lagoa, nem a cidade. Não havia sinal daquele lugar
que eu tinha amado no início dos anos 70. O crescimento imobiliário havia implodido as
belezas naturais. Como sempre, a destruição e o dinheiro falaram mais forte.
Descendo pela BR 101, estacionei em Criciúma, onde fui perseguido por mineiros, roupas e rostos enegrecidos pela extração do carvão, que não gostaram do
meu cabelo comprido.
Lembro deles em cima de uma caminhão mambembe, gritando ofensas. Xinguei de volta. Fiz sinais obscenos. O caminhão parou. Uns 30 mineiros desceram do veículo e me perseguiram por uma estrada de terra esburacada. É claro que eu corri mais rápido, senão não estaria aqui, contando a história.
Lembro deles em cima de uma caminhão mambembe, gritando ofensas. Xinguei de volta. Fiz sinais obscenos. O caminhão parou. Uns 30 mineiros desceram do veículo e me perseguiram por uma estrada de terra esburacada. É claro que eu corri mais rápido, senão não estaria aqui, contando a história.
Em Porto Alegre, caminhei até a casa de Érico Veríssimo. Parei diante da porta, mas não tive coragem de tocar a campainha.
Aos 19 anos, comprei
uma moto. No verão, acompanhado por um amigo também motociclista, fiz a viagem
de volta ao Rio Grande do Sul. Fomos pela BR 116 e também pela BR 101, que eu
já conhecia. As motos quebraram. Em meio às tempestades de verão, escapamos de
ser atropelados por caminhões gigantes pelo menos umas cem vezes.
Em casa, minha mãe não
conseguia dormir. Varava as madrugadas, assistindo TV, preocupada com o filho
motoqueiro.
Nos anos seguintes, faria várias viagens de motocicleta. A pior delas foi para a Bahia. Chovia sem parar. Lembro de estar parado em uma estrada, um caminho - meio de terra, meio de asfalto - nas proximidades da usina nuclear de Angra dos Reis, quando vi aquele caminhão do tamanho de um prédio de três andares vir se aproximando, chegando cada vez mais perto, tomando conta de tudo até parar a uns dez centímetros da minha perna, com as rodas escorregando na lama.
O caminhoneiro desceu o vidro. Pôs a cabeça para fora da porta e perguntou se eu não tinha medo de morrer. Estranhamente, não tinha. Era jovem e como todo jovem me achava imortal.
Nos anos seguintes, faria várias viagens de motocicleta. A pior delas foi para a Bahia. Chovia sem parar. Lembro de estar parado em uma estrada, um caminho - meio de terra, meio de asfalto - nas proximidades da usina nuclear de Angra dos Reis, quando vi aquele caminhão do tamanho de um prédio de três andares vir se aproximando, chegando cada vez mais perto, tomando conta de tudo até parar a uns dez centímetros da minha perna, com as rodas escorregando na lama.
O caminhoneiro desceu o vidro. Pôs a cabeça para fora da porta e perguntou se eu não tinha medo de morrer. Estranhamente, não tinha. Era jovem e como todo jovem me achava imortal.
Aos 20 anos, saí da casa de meus pais. Aluguei um
quarto em uma casa no bairro de Moema e fui morar sozinho. A casa, um sobrado
simpático com jardim na frente, era de um alemão, que viera ao Brasil, depois
do fim da 2ª Guerra Mundial. Era viúvo. Morava só. Por isso, alugava os quartos
para jovens, como eu. Ele lia livros sobre a Luftwaffe, blitzkrieg, tanques Panzer. Cozinhava repolho e outras barbaridades
malcheirosas.
Minha mãe não entendia
por que eu tinha saído de casa. Uma vez, de manhã, saí correndo para ir
trabalhar. Estava atrasado. Enquanto tirava a corrente da moto, ela aparece ao
meu lado, chorando, segurando um lencinho. Pedia para eu voltar para casa. Gritei
com ela. Pedi para ela sumir da minha vida. Nunca mais me procurar. "Me esqueça", pedi.
Enfim, não era fácil ser minha mãe.
Enfim, não era fácil ser minha mãe.
Com 30 e poucos anos, uma reviravolta na vida pessoal fez com que eu baixasse na casa da minha mãe às 23h. Não tinha para onde ir. Carregava duas malas com peças de roupa, naquela situação "sem eira nem beira'.
Lembro do meu pai, com aquele casaco de tweed de sempre, chinelos de estilo franciscano que nunca combinaram com as meias escuras, mexendo no porta-chaves e vindo em minha direção com algo na mão. Ele me entregou a chave de casa e disse: "Seja bem-vindo". Foi um "tapa com luva de pelica", como se dizia no tempo em que as mulheres elegantes usavam luvas.
Meses depois, aluguei uma casa, próxima de onde moravam meus pais. Era um sobrado confortável, com um jardim minúsculo nos fundos, onde meus filhos, milagrosamente, colhiam morangos.
Lembro do meu pai, com aquele casaco de tweed de sempre, chinelos de estilo franciscano que nunca combinaram com as meias escuras, mexendo no porta-chaves e vindo em minha direção com algo na mão. Ele me entregou a chave de casa e disse: "Seja bem-vindo". Foi um "tapa com luva de pelica", como se dizia no tempo em que as mulheres elegantes usavam luvas.
Meses depois, aluguei uma casa, próxima de onde moravam meus pais. Era um sobrado confortável, com um jardim minúsculo nos fundos, onde meus filhos, milagrosamente, colhiam morangos.
Voltando ao sonho, tendo em vista o histórico conturbado mãe-filho, posso
imaginar que quem eu gostaria de cumprimentar no aniversário da minha mãe era,
na realidade, minha tia. Que está morta. Então, o sonho fez a parte dele, realizando um desejo inconsciente. Freud, como sempre, está de parabéns.
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