Simone de Beauvoir dizia que "ninguém nasce mulher, torna-se mulher". Parafraseando a filósofa, escritora e mulher de Jean-Paul Sartre, diria que "ninguém nasce ateu, torna-se ateu".
O ateu no Brasil tem uma vida difícil. A pesquisa aponta que, entre os eleitores tupiniquins, eles votariam em um negro para a Presidência. Também não veriam problema em eleger uma mulher ou um homossexual para o cargo mais alto do País, mas não seriam capazes de votar em um ateu.
"Deus é brasileiro", disse um papa certa feita. Somados todos os ateus brasileiros, eles totalizam 740 mil "almas". Menos de 1% da população.
Em países "menos desenvolvidos de espírito", os ateus são maioria. 85% dos suecos não têm religião. Na Dinamarca, eles são 80% que afirmam não acreditar em um ser superior.
A propósito, Dinamarca e a Suécia estão na lista dos países "mais felizes do mundo". Certamente, a ausência de religião tem aí algum fator a ser estudado.
Estudei em colégios religiosos. Por isso, só vim conhecer Darwin e a Origem das Espécies, quando era velhinho. O currículo também não mencionava Karl Marx, alguém que só vim a conhecer na pós-graduação.
No Arquidiocesano dos irmãos maristas, a gente aprendia que Deus criou o mundo em sete dias. Tirou uma costela de Adão para fazer Eva e por aí em diante. O irmão que lecionava biologia ficava numa encruzilhada difícil, quando algum aluno perguntava sobre os dinossauros. A saída mais fácil para o irmão era dizer que "Deus tinha espalhado os restos de dinossauros para os homens se divertirem pesquisando".
Criança era arrastado pela minha mãe para a missa, na época, rezada em latim. Todo aquele cerimonial, aquela parafernália medieval me provocava tédio. Tinha vontade de sair correndo da igreja pra ir jogar bola no campinho com os amigos. Minha mãe dizia que esse desejo de evasão era "o diabo agindo".
A morte do "filho de Deus" para aliviar a humanidade do pecado original, cometido por Adão e Eva, se tornava sem sentido, depois que os próprios padres nos diziam que "Adão e Eva era uma parábola, uma história antiga sobre o início da humanidade". Não era para levar aquilo a sério, com todas as letras.
O Deus que criava e depois matava quase todo mundo em uma inundação parecia sem lógica. "Se ele é Deus, como é possível se arrepender? Não prever que os homens iam ferrar com tudo", punha em dúvida as passagens bíblicas mais famosas.
Pragas divinas matavam 14 mil e 700 pessoas, 24 mil...
Na série West Wing, o personagem interpretado por Martin Sheen questiona uma ativista religiosa, que afirma que a homossexualidade é uma abominação, de acordo com Levítico 18:22.
Sheen passa a questioná-la: "Em Exodus 21:7, diz que posso vender minha filha mais nova como escrava. Ela fala italiano, por isso posso pedir um valor mais alto? Em Exodus 35:2, afirma-se que quem quiser trabalhar aos sábados deve ser morto. A gente mesmo pode matar essa pessoa ou precisa chamar a polícia?".
Sheen lembra que "a Bíblia também afirma que quem plantar vegetais diferentes, lado a lado, deve ser apedrejado até a morte. Em outra passagem, se a mãe usar roupas de cores diferentes deve ser queimada em praça pública".
Depois de velho, li A Origem das Espécies e lá tem uma passagem bem interessante. O autor, que era clérigo, afirma: "Todos os animais existentes hoje na Terra são originários de animais que existiram anteriormente - inclusive o homem". Era a teoria evolucionista, dando seus primeiros passos, destronando o deus criador e vingativo de judeus e cristãos.
Quando você diz para alguém que é ateu a reação é sempre estranha. Lembro de uma senhora, sorrindo e falando, "mas em Deus o senhor acredita, não é?"
Mesmo sabendo que sou ateu, amigos me enviam votos de bom dia e boa noite, garantindo que Deus vai me abençoar e me proteger. Outros falam em anjos, andando ao meu lado, mesmo contra a minha vontade.
Autores contemporâneos têm trabalhado a desconstrução desse ser extraterrestre, onipotente, onisciente etc. Recomendo as obras de Christopher Hitchens (Deus não é grande), Richard Dawkins (Deus é um delírio) e Freud, é claro. Em Totem e Tabu, Freud faz uma análise, ao mesmo tempo psicológica e antropológica, sobre o nascimento da religião, decorrente do assassinato do pai primevo.
Agora, o pior em ser ateu é viver em um País, em que o presidente eleito afirma que "Deus está acima de todos". A República ainda é laica, mas, certamente, isso vai ser derrubado nos próximos quatro anos.
A nota que a gente usa para pagar o pão na padaria vem impressa com a inscrição religiosa: "Deus seja louvado", por ordem e graça do então presidente José Sarney, católico praticante e, recentemente, denunciado 11 vezes pela Procuradoria Geral da República por maus-feitos.
Tenho dito...
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