A estátua de Julieta, diante da mansão dos Capuleto |
Viajei 12 mil quilômetros. Atravessei o oceano Atlântico. Passei por cima do Saara. Pela Espanha e cheguei no aeroporto Milão Malpensa. Comi uma pizza margherita (Nota 6,5. Mesmo pizza em aeroporto italiano tem de tirar nota 9 pra cima).
Aluguei um carro. Viajei mais 200 quilômetros até Verona, onde Julieta está enterrada, sem o Romeu. Cheguei ao destino. Esvaziei a mala. Saí para comprar alguma coisa para o jantar.
Está escuro. São 20h. Garoa. Ninguém à vista. Então, chega essa senhora, andando lentamente, com uma bolsa de supermercado.
Ensaiei o italiano trôpego: "Signora, per favore: dov'è un mercato da queste parti?". Ela olha bem para mim e diz, em um português brasileiro impecável: "Você é brasileiro, não é?".
Entre 60 milhões de italianos, a primeira pessoa que encontrei em uma rua da Itália era uma compatriota. Os brasileiros vivem a sua diáspora, motivada pela violência nas cidades e os tropeços da economia, sempre titubeante.
Na região norte da Itália, os empregos de operador de pedágio e frentista desapareceram. No pedágio, em meio a uma chuva abundante, uma escuridão apocalíptica, você se aproxima com o carro e não tem uma singular presença humana. A máquina vomita um bilhete. Você puxa aquilo fora e guarda. Certamente, vai utilizar em algum momento. E usa mesmo. Depois de percorrer um determinado número de quilômetros, aparece outro pedágio. Então, você enfia o bilhete na máquina e ela informa quanto tem de ser pago. Em um momento de pânico, enfiei meu cartão que necessita de senha para autorizar o débito ou crédito. Não sei como a máquina aceitou e me liberou a passagem, mesmo sem eu ter posto a senha. Com experiência, você vai pegando as manhas e sabendo como agir rapidamente, pagando e recebendo o troco. A máquina não erra nem um único centavo.
No posto de combustível, é mais complicado. Começa que eu não sabia o que era diesel ou gasolina. Cabe a você abrir o reservatório de combustível. Colocar o dinheiro na máquina e esperar que ela autorize sua utilização. Não adianta olhar em volta. Não adianta imaginar que vai aparecer alguém para lhe ajudar, porque não vai.
A principal atração turística de Verona é a casa onde morou Julieta. Tem uma estátua dela na porta. Diariamente, centenas, milhares de turistas trepam sobre a estátua e tiram fotos, passando a mão no peito da Julieta de bronze. Eles fazem caretas. Põem a língua para fora. Gritam. Dão risada.
Dizem que dá sorte passar a mão no peito da estátua. Para com isso, gente! A menina tem só 14 anos.
É uma pedofilia autorizada - e, quiçá, estimulada - pelas autoridades.
Outra atração de Verona é uma arena, construída anos após o Coliseu de Roma. A gente sobe aquelas dezenas de degraus e fica lá no alto, imaginando quantos escravos devem ter se arrebentado para erguer aquele monumento milenar. Construções espetaculares, velhos estádios, em que multidões se juntavam para ver as feras, os gladiadores, a morte extrema de animais e pessoas. Devia ser legal.
Na estrada, percorrendo as cidades vizinhas, o que se faz notar é a civilidade. Dirigindo, lembrei a frase famosa do anarquista russo Piotr Kropotkin (1842-1921): "A competição é a lei da selva; a cooperação é a lei da civilização", ainda que me permiti deixar Kropotkin totalmente fora do contexto.
O trânsito flui de maneira civilizada. De forma cooperativa. Cada motorista parece saber o que está fazendo e auxilia o próximo, dando setas e informando seu direcionamento. As estradas são ótimas, o asfalto irrepreensível. Os valentões parecem ter desaparecido das rodovias. Não se vê um carro cortando da esquerda para a direita e vice-versa. Não há outdoors grotescos, desbotados, desmantelando-se. As publicidades são disciplinadas e obedecem a um tamanho determinado, visualmente, não poluidor. Contei exatos dois carros... Exatamente, dois carros que estavam com o farol desregulado: um deles baixo e o outro na lanterna. É claro que pela via da esquerda, de vez em quando passa um bólido. Você nem consegue ver o que era. É a terra das Ferrari.
O restaurante Delle Nazioni, em Verona, foi um achado. O menu de 16 euros contempla dois pratos e sobremesa. As massas são excepcionais. Molhos leves, saborosos. O gnocchi ao forno boníssimo. O tiramissu estrelar. As pizzas inesquecíveis.
E o melhor de tudo: é um restaurante sem turistas. Comem lá somente o pessoal local. O atendimento é privilegiado. Cada vez que ia lá, o patrão me chamava no balcão e me servia um licor Limoncello, às vezes um aperitivo gelado de mirtilo, com as frutas vivas, balançando lá dentro do vidro. "Viva Brasile", ele dizia, enquanto servia o cálice.
Do ponto de vista estratégico, Verona fica próxima de Veneza e de cidades interessantes que valem a visita, como Sirmione, onde está o lago de Garda, "o maior lago da Itália".
Essas cidades italianas, como Sirmione, têm particularidades. Você entra em um café, que parece meio decadente, meio derrubado, e pede um chocolate quente. A caneca vem quase transbordando e o chocolate é denso, volumoso, profundo. Como diria um personagem de Larry David, saborear esse chocolate "é como se tivesse um circo dentro da minha boca".
"La statua di Giulietta a Verona"
Ho viaggiato 12 mila chilometri. Ho attraversato l'oceano Atlantico. Sono passato sopra il Sahara. Dalla Spagna sono arrivato all'aeroporto di Milano Malpensa. Ho mangiato una pizza margherita (Nota 6,5. Anche la pizza in un aeroporto italiano deve prendere almeno 9).
Ho noleggiato una macchina. Ho viaggiato altri 200 chilometri fino a Verona, dove è sepolta Giulietta, senza Romeo. Sono arrivato a destinazione. Ho svuotato la valigia. Sono uscito per comprare qualcosa per cena.
È buio. Sono le 20h. C'è una pioggerellina. Nessuno in vista. Poi arriva questa signora, camminando lentamente, con una borsa della spesa.
Ho provato il mio italiano traballante: "Signora, per favore: dov'è un mercato da queste parti?". Lei mi guarda bene e dice, in un portoghese brasiliano impeccabile: "Tu sei brasiliano, vero?".
Tra 60 milioni di italiani, la prima persona che ho incontrato in una strada italiana era una connazionale. I brasiliani vivono la loro diaspora, motivata dalla violenza nelle città e dai passi falsi dell'economia, sempre incerta.
Nel nord Italia, i lavori di operatore di pedaggio e benzinaio sono scomparsi. Al casello, sotto una pioggia abbondante, un'oscurità apocalittica, ti avvicini con la macchina e non c'è una singola presenza umana. La macchina sputa un biglietto. Lo prendi e lo conservi. Sicuramente lo userai in qualche momento. E lo usi davvero. Dopo aver percorso un certo numero di chilometri, appare un altro casello. Allora infili il biglietto nella macchina e ti dice quanto devi pagare. In un momento di panico, ho inserito la mia carta che richiede un PIN per autorizzare l'addebito o il credito. Non so come la macchina l'abbia accettata e mi abbia fatto passare, anche senza aver inserito il PIN. Con l'esperienza, impari i trucchi e sai come agire rapidamente, pagando e ricevendo il resto. La macchina non sbaglia un solo centesimo.
Alla stazione di servizio, è più complicato. Innanzitutto, non sapevo cosa fosse il diesel o la benzina. Tocca a te aprire il serbatoio del carburante. Mettere i soldi nella macchina e aspettare che autorizzi l'uso. Non serve guardarsi intorno. Non serve immaginare che apparirà qualcuno per aiutarti, perché non accadrà.
La principale attrazione turistica di Verona è la casa dove viveva Giulietta. C'è una statua di lei alla porta. Ogni giorno, centinaia, migliaia di turisti si arrampicano sulla statua e scattano foto, passando la mano sul petto di Giulietta di bronzo. Fanno smorfie. Tirano fuori la lingua. Gridano. Ridono.
Dicono che porti fortuna passare la mano sul petto della statua. Smettetela, gente! La ragazza ha solo 14 anni.
È una pedofilia autorizzata - e, forse, stimolata - dalle autorità.
Un'altra attrazione di Verona è un'arena, costruita anni dopo il Colosseo di Roma. Si salgono quelle decine di gradini e si rimane lassù in alto, immaginando quanti schiavi devono essersi rotti per costruire quel monumento millenario. Costruzioni spettacolari, vecchi stadi, dove le folle si riunivano per vedere le belve, i gladiatori, la morte estrema di animali e persone. Doveva essere bello.
Sulla strada, percorrendo le città vicine, ciò che si nota è la civiltà. Guidando, ho ricordato la famosa frase dell'anarchico russo Piotr Kropotkin (1842-1921): "La competizione è la legge della giungla; la cooperazione è la legge della civiltà", anche se ho lasciato Kropotkin totalmente fuori dal contesto.
Il traffico scorre in modo civile. In modo cooperativo. Ogni automobilista sembra sapere cosa sta facendo e aiuta il prossimo, mettendo le frecce e informando la sua direzione. Le strade sono ottime, l'asfalto impeccabile. I prepotenti sembrano essere scomparsi dalle autostrade. Non si vede una macchina che taglia da sinistra a destra e viceversa. Non ci sono cartelloni grotteschi, sbiaditi, che si sbriciolano. Le pubblicità sono disciplinate e rispettano una dimensione determinata, visivamente non inquinante. Ho contato esattamente due macchine... Esattamente, due macchine che avevano i fari fuori posto: uno basso e l'altro con la luce posteriore accesa. Certo, sulla corsia di sinistra, ogni tanto passa un bolide. Non riesci nemmeno a vedere cosa fosse. È la terra delle Ferrari.
Il ristorante Delle Nazioni, a Verona, è stata una scoperta. Il menu da 16 euro comprende due piatti e un dessert. Le paste sono eccezionali. Salse leggere, saporite. Gli gnocchi al forno buonissimi. Il tiramisù stellare. Le pizze indimenticabili.
E la cosa migliore: è un ristorante senza turisti. Ci mangiano solo i locali. Il servizio è privilegiato. Ogni volta che andavo lì, il padrone mi chiamava al bancone e mi serviva un liquore Limoncello, a volte un aperitivo freddo di mirtillo, con i frutti vivi, che ballavano dentro il bicchiere. "Viva Brasile", diceva, mentre serviva il calice.
Dal punto di vista strategico, Verona è vicina a Venezia e a città interessanti che vale la pena visitare, come Sirmione, dove si trova il lago di Garda, "il più grande lago d'Italia".
Queste città italiane, come Sirmione, hanno delle particolarità. Entri in un caffè, che sembra un po' decadente, un po' diroccato, e ordini una cioccolata calda. La tazza arriva quasi straripante e il cioccolato è denso, voluminoso, profondo. Come direbbe un personaggio di Larry David, assaporare questo cioccolato "è come se avessi un circo in bocca".
Nenhum comentário:
Postar um comentário