sábado, 9 de novembro de 2019

O PT saiu da cadeia junto com Lula



A saída do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ontem da prisão, em Curitiba (PR), foi apoteótica. Teve discurso, homenagens, abraços, beijos e felicitações mil. Não foi só Lula que saiu da cadeia. O PT, também. 

Houve reparação de uma injustiça. Na quinta-feira, o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu por 6 votos a 5 que a Constituição deve ser respeitada. Em seu artigo 5º, a Constituição ordena que a prisão só deve ocorrer depois de "trânsito em julgado". Significa que, enquanto houver instância jurídica a ser percorrida, o acusado não pode ser preso.

A Lava Jato atropelou a Constituição. Prendeu opositores. Guardou Lula na cadeia, para não participar da eleição de 2018. Mesmo debaixo de uma avalanche sempiterna de acusações, com a mídia oficial descendo o cacete, Lula venceria o pleito. A solução foi enquadrá-lo. Em abril de 2018, com voto decisivo da então presidente do STF, Cármen Lúcia, foi negado habeas corpus a Lula. Pouco depois, o líder do Partido dos Trabalhadores seria preso e levado à "República de Curitiba".

A prisão de Lula foi uma excrescência jurídica. Não havia provas contra ele. Veja o que diz o então "comandante supremo" da Lava Jato, Deltan Dallagnol, a um grupo de WhatsApp, antes de apresentar o power point, que ligaria todas as flechas da corrupção a Lula:

“Falarão que estamos acusando com base em notícia de jornal e indícios frágeis… então é um item que é bom que esteja bem amarrado. Fora esse item, até agora tenho receio da ligação entre petrobras e o enriquecimento, e depois que me falaram to com receio da história do apto… São pontos em que temos que ter as respostas ajustadas e na ponta da língua”    


Graças à Vaza Jato, perpetrada pelo site The Intercept Brasil, ficamos sabendo aquilo que já imaginávamos. Não havia mesmo provas factuais contra Lula. Era um movimento político para "quebrar as pernas" do ex-presidente. 

Tem o outro lado. O artigo 5º precisa ser modificado. Não dá mais para suportar a impunidade. Político corrupto tem de ir pra cadeia. Esse "trânsito em julgado" é um atraso de vida. Quem tinha bons advogados, como era o caso de Paulo Maluf, corrupto sacramentado, nunca ia preso. Recorria aqui. Recorria acolá. E ficava livre, leve e solto até o processo prescrever. 

Se a Lava Jato não conseguiu encontrar o "batom na cueca", expressão preferida do inesquecível Ricardo Boechat, isso não significa que não havia corrupção no governo petista. No primeiro mandato de Lula na Presidência, o então ministro da Casa Civil, José Dirceu, subornava parlamentares para aprovar projetos, no esquema chamado de Mensalão. Depois, viria o PetrolãoMilhões de recursos da Petrobras foram desviados. Foi tanta grana que quase quebrou a Petrobras

O esquema - descoberto pela Lava Jato de Dallagnol, Sergio Moro & cia. - revirava as entranhas da corrupção política. Empresários pagavam propina a políticos. Conseguiam faturar milhões em obras. E devolviam essas facilidades, repassando recursos para os partidos. Recursos públicos eram drenados e voavam para o exterior, graças a uma bem orquestrada indústria de doleiros. Na cara dura, políticos ligavam para empresários e pediam dinheiro. O ex-presidenciável Aécio Neves foi pilhado em uma gravação, com o pires na mão, querendo 2 milhões de reais.    

A Lava Jato buscou os holofotes e os encontrou. Do dia para noite, procuradores e juízes anônimos viraram celebridades. A mídia oficial transformou esse pessoal da toga e terno cinza de pastor evangélico nos heróis da resistência. Os políticos - praticamente todos eles, sem exceção - eram os bandidos da história.

No meio desse torvelinho, a pobre presidente Dilma Roussef foi derrubada. Graças a um problema contábil, chamado de "pedalada", dois advogados - o circunspecto Miguel Reale Jr. e a psicodélica Janaína Paschoal - abriram processo de impeachment, que ganhou sinal verde do então presidente da Câmara, Eduardo Cunha. Dilma desceu a ladeira do Palácio do Planalto. Depois, seria a vez do corrupto Cunha cair em desgraça e ser enjaulado. 

Enquanto ocorriam as prisões de políticos, empresários, empreiteiros, doleiros, o vai e vem de advogados aos tribunais, para libertar os corruptos, ganhava ares de romaria perdida, em que os fiéis andam milhares de quilômetros e, ao chegar ao destino, não encontram mais o santo no lugar devido.

Os advogados de defesa nunca tinham visto nada parecido. A Lava Jato prendia e não soltava. Para isso, os procuradores se transformaram em Batman, na comparação feliz do jornalista da direita conservadora Reinaldo Azevedo. Batman e bandidos têm muito em comum. Todos atropelam a lei. Batman combate os criminosos, sem se importar com direitos civis e constitucionais. O juiz Sergio Moro comandava os procuradores da Lava Jato, dando dicas, fazendo sugestões, sendo tudo, menos um juiz imparcial. 

Moro condenou Lula a nove anos e seis meses de prisão, baseado em "convicção". Não havia o "batom na cueca". Apenas a convicção de que Lula era corrupto. A mídia oficial delirou. Moro ganhou as manchetes. No maniqueísmo de ocasião, os petistas eram bandidos e os justiceiros de toga, os mocinhos.

Como prêmio pelos bons serviços prestados, Moro foi guindado, no início deste ano, a ministro da Justiça do governo Jair Bolsonaro. Eleito na esteira do ódio ao PT, Bolsonaro obteve 57 milhões de votos. 89 milhões de eleitores não votaram nele. 47 milhões preferiram o candidato petista, Fernando Haddad, apoiado por Lula. E 42 milhões decidiram não votar em ninguém, enojados com tanta corrupção política.

 Veio a Vaza Jato, do The Intercept Brasil, e a opinião pública entendeu que a Lei maior, a Constituição, havia sido desrespeitada pelos "heróis" da Lava Jato. Imensamente felizes com a fama súbita, os procuradores lavajatistas faturavam os tubos em palestras bem remuneradas. 

Com a Lava Jato sob escrutínio, os ministros deuses do STF reuniram-se na quinta-feira e fizeram o que se espera deles: preservaram a Constituição. Assim, o famoso artigo 5º acabou prevalecendo e com ele, a libertação de Lula, preso injustamente. 

Dizem que Lula percorrerá novamente o País em uma reedição da "caravana da esperança". Antes disso, o PT - que saiu finalmente da cadeia - pode retornar às atividades. A começar, deveria fazer um mea culpa. É preciso pedir desculpas a seus eleitores, àquela gente ingênua que colocava adesivo da estrela petista na porta de suas casas e pendurava broches na lapela. O PT deve pegar um caixote de madeira, subir nele nas praças das cidades e gritar alto e bom som: 

"Pessoal, o PT errou. O PT permitiu que houvesse corrupção. O PT foi um partido igual aos outros. Nos desculpem. Isso não vai ocorrer novamente.

É isso que os eleitores de Lula esperam que ocorra. Não dá para fingir que nada ocorreu. Porque ocorreu. E o que aconteceu sujou a estrela petista. É preciso limpá-la. Fazer um rebranding da marca. Ano que vem haverá eleições municipais e o PT precisa estar preparado, porque senão vai levar outro cacete monumental das urnas.  

          

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