sábado, 31 de agosto de 2019

"Bacurau" é um Tarantino genérico e piorado


Chegou Bacurau! Toquem as trombetas. Estreou o novo filme de Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles. Podem desligar as trombetas. Bacurau é um exemplar genérico tarantinesco e bem piorado. 

A grande metáfora do filme: nós, os povos miseráveis do Nordeste, precisamos nos unir contra os malfeitores imperialistas. Nesse rol da bandidagem incluem-se os norte-americanos, propriamente ditos, e nós, os moradores aqui do Sudeste brasileiro.

Bacurau tem buracos de roteiro, que são incompreensíveis para um filme premiado em festival internacional. Começa o filme. Chega a um povoado miserável, feio e seco, uma assistente social com uma mala cheia de vacinas e remédios. A gente imagina que essa assistente social terá algum papel preponderante no cenário. Nada disso. A mulher se evapora. Ficamos na expectativa que ela vá fazer algo útil ou surpreendente. Mas não. Os roteiristas simplesmente se esqueceram dela ao longo da história. 

O pior é o personagem do prefeito. Ele é odiado pela população. As pessoas se escondem dele, quando o político pisa no lugarejo. Só que, eu, humilde espectador, gostaria de saber por quê. O que ele fez de tão grave para os moradores o detestarem tanto? Será que o crime dele é ser político? Então, todo político precisa ser defenestrado? É esse o recado? Vai saber. 

De repente, você acha que já viu esse filme em algum lugar. E viu mesmo. Vai na mesma toada de Jogos Vorazes. Não me venha falar em spoiler. Arrume uma palavra em português, antes de me encher o saco. 

Os heróis do filme são os bandidos. Tem um tipo, chamado Lunga, com visual andrógino, unhas pintadas de preto e a calça presa acima do umbigo. Ele é procurado pela Justiça. Deve ser a patrulha da moda que anda atrás dele. Outro criminoso, o Pacote, matou várias pessoas, de maneira covarde, assassinando-as a sangue frio. Os vídeos das execuções dele são reproduzidas em um misto de trio elétrico e carro alegórico para a população local, que assiste à noite, sem ter coisa melhor para fazer naquele fim de mundo. O roteiro dá a Pacote um protagonismo importante. Ele é um executor covarde, mas vai liderar a resistência aos imperialistas. É um assassino com espírito de liderança campesina.  Assim, lá vamos nós idolatrar, mais uma vez, o cangaço, Lampião, Maria Bonita e seus derivados. 

Aparecem dois representantes do Sul maravilha. No caso, Sudeste maravilha. É um casal. Eles querem ser iguais aos americanos psicopatas. Esses dois são assassinos frios, mas com ligeiro atraso mental. Não conseguem pressentir que estão correndo risco de vida, tratando com malucos armados para uma guerra particular. Os malucos xingam os representantes do Sudeste, dizendo que eles são "latinos", não são brancos como os verdadeiros norte-americanos. 

Ah, sim. O filme tem Sonia Braga. Ela é aquela maluquete, bêbada, suja, irreconhecível com o cabelo sem cor definida e sem qualquer participação no desenrolar da história. Se a personagem dela - chamada Domingas - não existisse, não faria a menor falta. Por que Sonia Braga está em Bacurau? O que ela foi fazer ali, meu deus? Eu que vi Sonia Braga nua, em Hair, bem ali na minha frente no teatro Bela Vista, com o então jovem e talentoso Ney Matogrosso, senti vontade de chorar em vê-la tão deplorável, tão sem razão de ser. 

Cuidado quando você for assistir a Bacurau. Tem sangue pra tudo quanto é lado. Leve uma roupa reserva, senão você vai sair com a camisa manchada da sala de exibição. E cuidado com as balas. Voam balas também pra tudo quanto é lugar. É bom se apresentar com colete a prova de balas. Tem personagem com cabeça arrancada. Tem criança assassinada. É um pesadelo, manchado de vermelho. 

Se a proposta da produção fosse fazer um libelo contra as armas, o armamentismo, então, deu errado. A ameaça não é derrotada pela inteligência ou argumentação. Quem destrói a ameaça, que paira sobre a cidade, são as armas.

O diretor e roteirista Kleber Mendonça tem dois longas excepcionais em seu currículo: O som ao redor e Aquarius. Não sei que história ele quis contar com esse Bacurau, mas não chegou lá. A gente não sente empatia pelos miseráveis. Não consegue entender os norte-americanos malucos. Kleber Mendonça deveria voltar a fazer filmes brasileiros. Imitar Hollywood não é a praia dele. Aliás, filme brasileiro made in Hollywood nem sempre dá certo. Padilha acertou na mosca com Tropa de Elite, que não é um filme brasileiro, mas hollywoodiano. Enfim, são 131 minutos da mais pura e completa exaustão. 

Na sala de exibição, onde assisti Bacurau, estava sendo exibida, na sala vizinha, o novo filme de Tarantino. A versão genérica parece a verdadeira, mas não realiza o efeito prometido. Prefira o Tarantino original. E tenho dito.

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