Os comunistas estão na moda. Nunca se
falou tanto em comunismo e comunistas como agora, em 2019. No século passado,
em 1946, durante a Assembleia Constituinte, o Brasil contava com 14 deputados
comunistas - entre eles, o escritor baiano Jorge Amado (eleito por São Paulo).
Luiz Carlos Prestes (1898-1990), senador pelo Partido Comunista Brasileiro, era
sua liderança mais carismática e mitológica. Prestes ficaria apenas dois anos
no Senado, tendo seus direitos cassados. As eleições de 1946 foram, talvez, o apogeu
do PCB, o Partidão, no Brasil.
De lá para cá, o Partidão só
tem perdido espaço político. Em outubro do ano passado, os jornais noticiaram
que o PCB e o PC do B (Partido Comunista do Brasil) entrariam na "cláusula de
barreira". Sem o total de parlamentares eleitos, exigido pela lei eleitoral,
ficariam sem tempo na TV e sem a grana do fundo partidário.
Para um observador com recursos
parcos de inteligência, isso seria um indicativo que os partidos comunistas
registrados no Brasil estariam enfrentando séria crise existencial.
Mas, para o governo Bolsonaro, os
comunistas estão na ordem do dia. Tem comunista em tudo quanto é lugar.
"Olha lá, atrás daquela porta...Um comunista escondido". Tem
comunista em banco, em grandes empresas. Tem comunista até dono de jornal.
Acredite...
O discurso do novo ministro da
Educação, Abraham Weintraub (pronuncia-se Vaintraubi), segue nessa
linha. Weintraub enxerga comunas em monopólios, instituições
financeiras e - pelo que se depreende de sua fala - os esquerdistas estão
localizados, principalmente, dentro das grandes empresas jornalísticas.
Assim, de acordo com Weintraub,
João Roberto, José Roberto e Roberto Irineu - filhos herdeiros do poderoso
magnata da mídia brasileira Roberto Marinho – seriam “comunistas”,
comandando a Rede Globo, tendo um patrimônio de 29 bilhões de dólares, segundo
a revista Forbes.
Também seriam “comunistas” Johnny Saad
(Bandeirantes), Luiz Frias (Folha de
S.Paulo), a família Mesquita (Estadão), a família Sirotsky (Grupo RBS).
O comunismo, como se aprende no Ensino
Fundamental, é estatizante. Grandes empresas, monopólios, bancos, tudo isso
deixa de pertencer a seus sócios, suas famílias, e passa para o controle do
governo (comunista). Depois da Revolução Russa, em 1917, não havia mais
industriais, banqueiros, fazendeiros. Existia apenas o controle dos meios de
produção pelo estado bolchevique.
Seguindo o raciocínio do novo ministro da
Educação, as famílias Frias, Marinho, Mesquita, Saad, Sirotsky, fariam parte de
um majoritário plano marxista/bolchevique que visaria dar um tiro em seus
próprios pés, entregando suas propriedades e suas fortunas de características planetárias
para o estado comunista. Assim, eles ficariam de mãos abanando, indo trabalhar,
quem sabe, em uma fábrica de automóveis New Trabant.
Faz algum sentido
essa ladainha?
O filósofo sul-coreano Byung-Chul Han,
radicado na Alemanha, onde leciona na Universidade de Berlim, escreve em seu livro Sociedade do Cansaço sobre as
enfermidades que marcaram as épocas da humanidade.
Até o século 20, vivia-se o temor das
epidemias virais e bacteriológicas. Descobertos os antibióticos, afastados os
riscos das pandemias, entramos no século 21 em que prevalecem as doenças
neuronais, como depressão, transtorno de déficit de atenção, transtorno de
personalidade limítrofe, síndrome de burnout.
“O século passado foi uma época
imunológica. Trata-se de uma época na qual se estabeleceu uma divisão nítida
entre dentro e fora, amigo e inimigo (...) Mesmo a Guerra Fria seguiu esse
esquema imunológico”, escreve Chul Han.
O governo Bolsonaro e seus ministros do
calibre de um Weintraub frequentam os anos cinzentos da Guerra Fria. Para eles,
os comunistas são o inimigo a ser derrotado.
Eles continuam imersos na “época
imunológica”. Seus discursos são antigos, seus inimigos foram desgastados pelo
tempo, sua visão de mundo é velha. Eles pertencem ao século 20. Aos anos 50 do
século 20. Ainda não chegaram na Revolução Estudantil de maio de 1968. Não
viveram a liberação sexual dos anos 60. É um pessoal que usa um vocabulário
secular, ultrapassado.
O Brasil, entra século e sai século,
sempre retorna a esse jogo mentiroso. Em 1964, os militares derrubaram o
governo João Goulart, em razão da “ameaça comunista”.
Goulart era proprietário rural. Ele faria
a Revolução Comunista e entregaria seus 14 mil hectares de terra e suas 30 mil
cabeças de gado, que pastavam nos pampas de São Borja (RS), para os bolcheviques tupiniquins?
Em 1989, na primeira eleição para
presidente que participou Luiz Inácio Lula da Silva pelo PT, seus adversários o chamavam
de “comunista”.
“Não vamos deixar os comunistas vencer”,
gritavam os partidários de Fernando Collor de Mello, diante dos colégios
eleitorais.
Durante o governo Dilma, lembro de
um amigo de infância, apavorado, me informando que vivíamos sob uma “ditadura
comunista”.
Até quando vamos aturar tanta ignorância?
Não é uma ignorância do não saber, do desconhecer, mas uma ignorância forjada,
proposital, que visa a confusão, que cria “inimigos bacteriológicos” e os chama
de “comunistas”.
Precisamos de palavras novas. Sinceramente,
precisamos também de um novo governo, sem esses discípulos de Olavo maluquete
de Carvalho, e por aí afora.
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