domingo, 8 de junho de 2025

Humorista Leo Lins é censurado pela Justiça Federal

 

Leonardo de Lima Borges Lins, o humorista condenado

O início é óbvio: Constituição da República Federativa do Brasil, artigo 5º, que trata dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos. O parágrafo nove diz o seguinte:

“É livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”.

Se a expressão de atividade artística é livre de censura ou de licença, como pode um humorista sofrer condenação, por estar fazendo o seu ofício?

Aconteceu com Leo Lins. Em 2022, ele fez um show chamado “Perturbador”. O vídeo da apresentação foi parar na rede social (YouTube – 3 milhões de visualizações) e o Ministério Público Federal não gostou do que viu. Por isso, abriu um processo contra o humorista.

Três anos depois, no dia 3 de junho da semana passada, a juíza federal substituta Barbara de Lima Iseppi condenou o humorista a oito anos e três meses de prisão, mais pagamento de indenização de 303 mil reais.

A medida foi aplaudida por muita gente: intelectuais, jornalistas, gente com eira e gente sem beira e, inclusive, humoristas, como Pedro Cardoso, que fazia o personagem “Agostinho”, no programa “A grande família”, exibida pela TV Globo.

Em um longo texto na rede social Instagram, Pedro Cardoso associou o stand-up (comediante que fica em pé diante do público) ao fascismo e chamou a apresentação de Leo Lins como “discurso de ódio”.

Os jornais foram contra a condenação. Em editorial, intitulado “Quando piada dá cadeia, salve-se quem puder”, o vetusto Estadão escreveu o seguinte:

Punir piadas é sinal de fraqueza institucional, e não de justiça. O humor é parte da liberdade que protege o que nos incomoda, e uma sociedade plural não sobrevive à criminalização do riso”. O editorial prossegue:

“Mais do que um veredicto equivocado, é a expressão mais grotesca de uma tendência crescente: a criminalização do discurso incômodo sob o pretexto de proteger os vulneráveis. A toga virou armadura ideológica, e o Código Penal, instrumento de censura”.

O Globo escreveu: “São piadas – não crimes”.

Em sua sentença, com pelo menos dois erros graves de citação (a juíza menciona a lei 7.719, que cria uma categoria funcional do Tribunal Superior Eleitoral; ao invés da lei 7.716 que trata de racismo), a juíza confirma que o humorista é um personagem:

“Não obstante, ainda que se trate de uma personagem e não da pessoa de LEONARDO, é certo não se excluir o crime (...) o fato de se tratar de humor não configura um passe-livre para o cometimento de crimes, assim como o fato de se tratar de uma apresentação artística”.

E sentencia o réu:

“Somadas ambas as penas nos termos do artigo 69 do Código Penal, fica o réu condenado à pena definitiva de 08 (oito) anos, 03 (três) meses e 09 (nove) dias de reclusão, além de 39 (trinta e nove) dias- multa (...) A pena deverá ser cumprida inicialmente no regime fechado”.

Punir os humoristas não é novidade. O bobo da corte Triboulet (1479-1536) foi condenado à morte pelo rei Francisco I (há versões que dizem que essa condenação partiu do rei Luis XII). Durante uma apresentação, o bobo da corte Triboulet passou a mão na bunda do rei. Sua majestade não gostou e mandou matar o bobo. Triboulet se desculpou: “Me enganei, senhor. Achei que fosse a bunda da sua esposa, a rainha”.

Mais indignado ainda, o rei confirmou a condenação à morte e deu ao bobo da corte uma única regalia: ele poderia escolher a forma de sua execução. Triboulet propôs ao rei: “Então, escolho morrer de velhice”. O rei achou graça, perdoou e o exilou.

Aos 42 anos, o humorista Leo Lins não é engraçado. Suas piadas são apelativas, rasteiras e de péssimo gosto. Eu jamais sairia de casa para assistir a uma apresentação dele. Também não vou perder meu tempo assistindo aos vídeos dele nas redes antissociais.

Como lembrou a juíza, em sua sentença, o humorista faz piadas, dirigidas às minorias: negros, obesos, idosos, pessoas com HIV, indígenas, homossexuais, judeus, nordestinos, evangélicos e deficientes físicos.

As piadas de Lins são preconceituosas? E daí? A liberdade de expressão não existe para proteger discursos populares ou elegantes que não precisam de proteção, mas sim aquilo que desagrada, desafia convenções, irrita e até fere sensibilidades”, discorre o Estadão, em seu editorial.

A Justiça brasileira está correndo um sério risco: o de se transformar em órgão censor. Durante a Ditadura Militar, a censura era usada para calar dissidentes e opositores ao regime.

Na década de 1990, promotores do Ministério Público de São Paulo consideravam o jornal Notícias Populares impróprio para ser oferecido nas bancas. O NP, como era chamado, tinha manchetes sensacionalistas e publicava fotos de cadáveres na primeira página. Para os promotores, o jornal só poderia ser oferecido aos leitores se viesse embrulhado em um saco plástico, o que inviabilizaria a publicação, porque o NP vivia basicamente de venda em banca e precisava chamar a atenção de seus leitores.   

Em maio passado, a desembargadora Íris Helena Medeiros Nogueira condenou o jornal Zero Hora e a jornalista Rosane de Oliveira a pagarem uma indenização de 600 mil reais, por danos morais. O crime da jornalista: ela informou aos leitores do jornal que a desembargadora havia recebido, em determinado mês, a quantia de 662 mil reais. A notícia era verdadeira e os dados constavam no Portal da Transparência.

Em outro caso, em que a Justiça estava sendo usada para calar, o jornalista e escritor João Paulo Cuenca foi alvo de 140 processos, movidos por pastores da Igreja Universal, nos mais diversos e longínquos rincões deste País de dimensões continentais.

O crime de Cuenca: ele noticiou que o governo brasileiro (na época, o presidente era Jair Bolsonaro) iria subsidiar canais e emissoras de igrejas evangélicas, mesmo que estas estivessem em dívida com o estado.

Houve reação, felizmente. E partiu do próprio Judiciário. No início deste ano, o Ministério Público Federal moveu processo contra a Igreja Universal por “assédio judicial”.

Qual foi o crime que Leo Lins cometeu? Nenhum. Ele contou piadas. Você não gosta das piadas dele? Elas são de péssimo gosto, abjetas? É simples; não vá às apresentações dele; não veja os vídeos nas redes sociais.

Como disse o Estadão, em seu editorial inspirado: “O Brasil precisa resistir a esse impulso regressivo e repressivo. Piadas ruins devem ser criticadas, e não criminalizadas. Discursos odiosos devem ser desmoralizados, e não aniquilados com prisão. O riso – inclusive o cruel, ácido, perturbador – é uma válvula essencial das sociedades livres. Retirá-lo do espaço público é sufocar a liberdade”.

Espero que uma próxima instância judicial derrube a sentença da juíza substituta. Caso percorra todas as instâncias, sem sucesso, e chegue ao STF (Supremo Tribunal Federal) caberá aos ministros, que são guardiões da Constituição, preservar a letra da lei, conforme assinala o Artigo 5º, parágrafo nono. Censura nunca mais. Mesmo! 

Leia a íntegra da sentença da juíza Barbara de Lima Iseppi:

https://www.conjur.com.br/wp-content/uploads/2025/06/sentenca-Leo-Lins-discriminacao-show-stand-up.pdf


Comedian Leo Lins is censored by the Federal Court

 The starting point is obvious: The Constitution of the Federative Republic of Brazil, Article 5, which deals with Individual and Collective Rights and Duties. Paragraph nine states:“The expression of intellectual, artistic, scientific, and communicative activity is free, independent of censorship or licensing.”If the expression of artistic activity is free from censorship or licensing, how can a comedian be convicted for simply doing his job?This happened to Leo Lins. In 2022, he performed a show called “Perturbador” (Disturbing). 

The video of the performance ended up on social media (YouTube – 3 million views), and the Federal Public Prosecutor’s Office didn’t like what they saw. As a result, they filed a lawsuit against the comedian.Three years later, on June 3 of last week, substitute federal judge Barbara de Lima Iseppi sentenced the comedian to eight years and three months in prison, plus a fine of 303,000 reais.The decision was applauded by many: intellectuals, journalists, people from all walks of life, and even fellow comedians like Pedro Cardoso, who played the character “Agostinho” in the TV Globo show “A Grande Família” (The Big Family).In a lengthy Instagram post, Pedro Cardoso associated stand-up comedy (where the comedian performs in front of an audience) with fascism and called Leo Lins’ performance “hate speech.

The newspapers, however, opposed the conviction. In an editorial titled “When Jokes Land You in Jail, Run for Your Life,” the venerable Estadão wrote:“Punishing jokes is a sign of institutional weakness, not justice. Humor is part of the freedom that protects what offends us, and a pluralistic society cannot survive the criminalization of laughter.” The editorial continued:“More than a mistaken verdict, this is the most grotesque expression of a growing trend: the criminalization of uncomfortable speech under the pretext of protecting the vulnerable. The judge’s robe has become ideological armor, and the Penal Code, an instrument of censorship.”O Globo wrote: “They’re jokes—not crimes.”

In her ruling, which contained at least two serious citation errors (the judge referenced Law 7,719, which establishes a functional category for the Superior Electoral Court, instead of Law 7,716, which deals with racism), the judge acknowledged that the comedian was performing a character:“Nevertheless, even if it is a character and not LEONARDO himself, it does not exclude the crime (...) the fact that it is humor does not grant a free pass to commit crimes, just as an artistic performance does not.”And she sentenced the defendant:

*“Combining both penalties under Article 69 of the Penal Code, the defendant is sentenced to a definitive term of 08 (eight) years, 03 (three) months, and 09 (nine) days of imprisonment, in addition to 39 (thirty-nine) days-fine (...) The sentence shall initially be served under a closed regime.”*Punishing comedians is nothing new. The court jester Triboulet (1479–1536) was sentenced to death by King Francis I (some versions say King Louis XII). During a performance, Triboulet slapped the king’s rear end. His Majesty didn’t appreciate it and ordered the jester’s execution. Triboulet apologized: “My mistake, sire. I thought it was your wife’s, the queen’s, rear.

Even more outraged, the king confirmed the death sentence but granted Triboulet one privilege: he could choose his method of execution. Triboulet then said: “Then I choose to die of old age.” 

The king found the joke amusing and pardoned him.At 42, comedian Leo Lins is not funny. His jokes are crude, cheap, and in poor taste. I would never leave my house to watch his show, nor would I waste my time watching his videos on antisocial media.As the judge noted in her ruling, the comedian makes jokes targeting minorities: Black people, the obese, the elderly, people with HIV, Indigenous people, homosexuals, Jews, Northeasterners, Evangelicals, and the disabled.“Are Lins’ jokes prejudiced? So what? Freedom of expression doesn’t exist to protect popular or elegant speech that needs no protection, but rather what offends, challenges conventions, irritates, and even hurts sensibilities,” argued Estadão in its editorial.Brazil’s judiciary is running a serious risk: becoming a censorship body. During the Military Dictatorship, censorship was used to silence dissidents and regime opponents.In the 1990s, São Paulo prosecutors considered the newspaper Notícias Populares unfit to be sold at newsstands. NP, as it was called, had sensationalist headlines and published photos of corpses on its front page. The prosecutors argued that the newspaper should only be sold if wrapped in plastic, which would have made publication unviable—since NP relied on newsstand sales and needed to catch readers’ attention.

Last May, appellate judge Íris Helena Medeiros Nogueira ordered the newspaper Zero Hora and journalist Rosane de Oliveira to pay 600,000 reais in moral damages. The journalist’s crime? Reporting that the judge had received 662,000 reais in a given month—a true story, backed by data from the Transparency Portal.In another case of judicial silencing, journalist and writer João Paulo Cuenca faced 140 lawsuits filed by pastors of the Universal Church across Brazil’s vast territory.Cuenca’s crime? Reporting that the Brazilian government (then under President Jair Bolsonaro) would subsidize evangelical TV channels and radio stations—even if they owed money to the state.Fortunately, there was pushback—from the judiciary itself. Earlier this year, the Federal Public Prosecutor’s Office sued the Universal Church for “judicial harassment.”What crime did Leo Lins commit? None. He told jokes. Don’t like his jokes? Find them tasteless, vile? It’s simple: don’t attend his shows; don’t watch his videos.

As Estadão eloquently argued in its editorial: “Brazil must resist this regressive, repressive impulse. Bad jokes should be criticized, not criminalized. Hateful speech should be discredited, not crushed with prison. Laughter—even cruel, biting, disturbing laughter—is an essential pressure valve in free societies. Removing it from public life is suffocating freedom.”I hope a higher court overturns the substitute judge’s ruling. If the case reaches the Supreme Court (STF), it will fall to the justices—guardians of the Constitution—to uphold the law as stated in Article 5, Paragraph 9. No more censorship. Ever.Read the full ruling by Judge Barbara de Lima Iseppi:

https://www.conjur.com.br/wp-content/uploads/2025/06/sentenca-Leo-Lins-discriminacao-show-stand-up.pdf




domingo, 25 de maio de 2025

Documentário Rita Lee – Mania de Você esquece 1967 e Os Mutantes

 

Os críticos de música costumam dizer que o Festival de MPB da TV Record, edição 1967, foi o maior evento musical da história da música brasileira. Não é para menos. A música “Ponteio”, de Edu Lobo, foi a vencedora. As cinco primeiras colocadas eram obras primas: em segundo, ficou “Domingo no Parque”, de Gilberto Gil; em terceiro, “Roda Viva”, de Chico Buarque; em quarto, “Alegria, alegria”, de Caetano Veloso; e em quinto, “Ventania”, com Geraldo Vandré.

Na época, havia uma rusga entre o pessoal do banquinho e violão com os roqueiros das guitarras elétricas. O pessoal da MPB chamava os roqueiros de “alienados”. E os roqueiros achavam que a MPB não estava com nada.

Gilberto Gil fez algo impensável. Chamou “Os Mutantes” para acompanhá-lo em “Domingo no Parque”. “Os Mutantes” eram do rock psicodélico, com muita guitarra e uma cantora de 20 anos, chamada Rita Lee, mandando ver.

“Domingo no Parque” é uma música em forma de “fait divers”. Narra um homicídio, movido por ciúmes. A música tem um momento como se as letras estivessem girando na roda gigante do parque de diversões. Em seguida, é como pequenos flashes, daquelas máquinas fotográficas antigas, testemunhando o aparecimento de uma faca e a morte, em seguida.

Além da poética brilhante, o mais legal foi ver “Os Mutantes” tocando MPB. Era uma vingança pessoal dos roqueiros e deu muito certo. Gilberto Gil e os mutantes Rita Lee, Arnaldo Baptista e Sérgio Dias fizeram história.

Isso tudo aconteceu em 1967 e ficou de fora do documentário “Rita Lee – Mania de Você”, que, praticamente começa em 1976, quando a cantora conhece Roberto de Carvalho, um baixista que acompanhava Ney Matogrosso. Ela faz um jantar e convida Ney Matogrosso. Pede que o cantor traga “o baixista”. Começa uma história de amor que geraria três filhos e dois netos.

O documentário, em exibição pelo Max (streaming), tem momentos edificantes, como a leitura de uma carta, deixada pela cantora a seus filhos e marido. Os álbuns, os sucessos, têm sua história revelada e é um presente para os fãs. Pena que “Os Mutantes” foram deixados de fora.

Em 1972, trabalhava em uma agência bancária, que ficava na esquina da rua Joaquim Távora com a avenida Domingos de Moraes. Minha vida era cinzenta. Usava camisa social e gravata. Trabalhava muito e ganhava pouco. Os pais de Rita Lee moravam na Joaquim Távora e, em raros momentos, eu via a cantora na Domingos de Moraes, com seu cabelo vermelho vivo, as roupas coloridas, óculos escuros, a felicidade da juventude plena em seu olhar. Queria sair do meu mundo cinzento e entrar naquela paleta de cores ritaleeiana. Mas não era músico. Nunca quis aprender a tocar um instrumento. Portanto, estava condenado à mediocridade dos comuns.

Anos mais tarde, muitos anos depois, quando morava na Granja Viana, voltei a rever Rita Lee. Ela era agora uma senhora e estava tirando coisas do carro, estacionado na porta de casa. O mesmo cabelo vermelho, óculos de sol azulado e ar de poucos amigos.

A casa dela era um ponto de referência na Granja. Sempre que levávamos alguém almoçar ou jantar no “Centrinho”, a gente dizia: “Está vendo essa casa? É aí que mora a Rita Lee”.

O long play era um disco de vinil, que armazenava uns 23 minutos de música de cada lado. Em 1979, a gente tinha comprado “Mania de você” (o long play) e escutávamos, em nosso primeiro apartamento na rua Topázio, na Aclimação. As preferidas eram “Chega mais”, “Doce vampiro” e “Mania de você”. O disco foi um sucesso absurdo. No ano seguinte, foi a vez de “Lança Perfume”, que a gente também comprou e que também estourou nas paradas e chegou com força até no exterior.

Em 1981, nós tínhamos viajado para a Inglaterra e eu trabalhava em um hotel familiar em Brighton. Pela manhã, ajudava na cozinha, depois trocava as roupas das camas e passava o aspirador nos três pisos do hotel.

Uma manhã (sempre fria e chuvosa), entrei na cozinha para ajudar a senhora, dona do hotel, na preparação do café da manhã. O rádio tocava “Lança perfume”. A senhora cantarolava, feliz da vida. Eu comecei a cantar, em português, e ela quis saber sobre o que era a música.

“It’s a couple making love”, eu disse.

Surpresa, ela suspirou:

“Oh, dear”.

Depois, quando nos mudamos para a França, “Lança perfume”, “Mania de você”, as composições de Chico Buarque, Jorge Bem Jor, Caetano Veloso, Gilberto Gil eram presenças constantes nas rádios. Era impressionante como a música brasileira tocava ao longo das programações das emissoras. Hoje, MC Ryan parece longe de superar as fronteiras. Por enquanto, limita-se ao gramado do estádio do 15 de Piracicaba.

Por falar na França, li “Mudar: Método”, de Édouard Louis, jovem autor de 32 anos, que em outubro do ano passado, esteve no programa “Roda Viva”, da TV Cultura. Em seu livro, descreve tudo o que teve de fazer para alcançar fama e sucesso. Foi prostituto, se aproximava das pessoas para obter vantagens pessoais, conquistava amigos que poderiam lhe ser úteis no futuro. Vítima de homofobia e assédio moral, desde criança, o autor foi criado por uma família pobre, que lhe deixava horas vendo TV. A mãe fumava sem parar e o pai era um assalariado sem cultura. O livro é estranho, porque, embora pareça buscar a empatia do leitor, relatando sua vida de dor e sofrimento, a gente acaba olhando para o autor como aquele que diz: “ah, meu caro, então, você é um velhaco, aproveitador, interesseiro”.

É uma narrativa de dores pessoais. A molecada costuma chamar essa prática de “mi-mi-mi”. O nome do livro poderia ser: "Memórias de um arrivista" ou "Recordações de um alpinista social".



E por falar em choradeira, os fãs de Lady Gaga estão inconformados com a cantora, que os deixou literalmente a ver navios, diante do Copacabana Palace, onde ela se hospedou, para o show de 2 milhões de espectadores. Os fãs não se conformam que Lady Gaga os ignorou solenemente, enquanto faziam plantão diante do hotel, na esperança fugaz de ver a cantora ao vivo e em cores. Mas Lady Gaga não deu as caras. Lady Gaga está em Singapura, onde deu, sim, as caras e saiu andando pelas ruas singapurenses, em busca de cerveja.

Essa idolatria ao ídolo fabricado pela indústria cultural, me faz recordar a adolescência. Aos 15 anos, tentei escrever uma história de ficção. Esbarrei em um sério problema: todos os personagens, que imaginava, tinham nomes em inglês. Eram John, Steve, Maycon...

Aquilo me incomodou tanto que, anos depois, quando fui fazer um projeto de dissertação de mestrado, pensei em pensar sobre isso, sobre essa invasão cultural, essa dominação a que estamos submetidos. Só que na academia lembro de um professor balançando a cabeça e dizendo: “não, não, não, escolhe outro tema. Esse não vai dar certo”.


Les critiques musicaux affirment souvent que le Festival de MPB de la TV Record, édition 1967, fut le plus grand événement musical de l'histoire de la musique brésilienne. Et pour cause. La chanson "Ponteio", d'Edu Lobo, en fut la gagnante. Les cinq premières places étaient des chefs-d'œuvre : en deuxième, "Domingo no Parque" de Gilberto Gil ; en troisième, "Roda Viva" de Chico Buarque ; en quatrième, "Alegria, alegria" de Caetano Veloso ; et en cinquième, "Ventania" de Geraldo Vandré.

À l'époque, il y avait une rivalité entre les adeptes de la guitare acoustique et les rockeurs aux guitares électriques. Les partisans de la MPB traitaient les rockeurs d'"aliénés", tandis que ces derniers trouvaient la MPB dépassée.

Gilberto Gil fit alors l'impensable : il invita Os Mutantes à l'accompagner sur "Domingo no Parque"Os Mutantes représentaient le rock psychédélique, avec des guitares saturées et une chanteuse de 20 ans, Rita Lee, qui assurait.

"Domingo no Parque" est une chanson inspirée des faits divers. Elle raconte un meurtre passionnel. La musique donne l’impression que les paroles tournent dans une grande roue de parc d'attractions, puis défile comme une série de flashs, comme ceux des vieux appareils photo, capturant l'apparition d'un couteau et la mort qui s'ensuit.

Au-delà de la poésie brillante, le plus génial fut de voir Os Mutantes jouer de la MPB. C’était une revanche des rockeurs, et ça a parfaitement fonctionné. Gilberto Gil, accompagné de Rita Lee, Arnaldo Baptista et Sérgio Dias, écrivirent l’histoire.

Tout cela se passa en 1967, mais fut absent du documentaire "Rita Lee – Mania de Você", qui commence pratiquement en 1976, lorsque la chanteuse rencontre Roberto de Carvalho, un bassiste qui accompagnait Ney Matogrosso. Elle organise un dîner et invite Ney Matogrosso en lui demandant d’amener "le bassiste". Commence alors une histoire d’amour qui donnera trois enfants et deux petits-enfants.

Le documentaire, diffusé sur Max (streaming), contient des moments émouvants, comme la lecture d’une lettre laissée par la chanteuse à ses enfants et son mari. Les albums, les succès, y révèlent leur histoire, offrant un cadeau aux fans. Dommage que Os Mutantes en aient été exclus.

En 1972, je travaillais dans une agence bancaire, située au coin de la rue Joaquim Távora et de l’avenida Domingos de Moraes. Ma vie était terne : chemise formelle, cravate, beaucoup de travail et peu d’argent. Les parents de Rita Lee habitaient sur la Joaquim Távora, et parfois, je croisais la chanteuse sur la Domingos de Moraes, avec ses cheveux rouges éclatants, ses vêtements colorés, ses lunettes noires et ce regard empli de la joie de vivre. Je rêvais de quitter mon monde gris pour entrer dans sa palette de couleurs "ritaleeiennes". Mais je n’étais pas musicien, je n’ai jamais voulu apprendre un instrument. J’étais donc condamné à la médiocrité des gens ordinaires.

Des années plus tard, bien plus tard, alors que je vivais à Granja Viana, je revis Rita Lee. Elle était désormais une dame, en train de décharger des affaires de sa voiture garée devant chez elle. Mêmes cheveux rouges, mêmes lunettes bleutées, et cet air un peu distant.

Sa maison était un point de repère à Granja Viana. Chaque fois que nous y emmenions quelqu’un pour déjeuner ou dîner au "Centrinho", nous disions : "Tu vois cette maison ? C’est là que vit Rita Lee."

Le long play était un disque vinyle qui contenait environ 23 minutes de musique par face. En 1979, nous avions acheté "Mania de Você" (le LP) et l’écoutions dans notre premier appartement, rue Topázio, à Aclimação. Nos préférées étaient "Chega mais""Doce vampiro" et "Mania de você". L’album fut un succès monstre. L’année suivante, ce fut "Lança Perfume", que nous achetâmes aussi et qui explosa également les charts, jusqu’à l’étranger.

En 1981, nous étions partis en Angleterre, où je travaillais dans un hôtel familial à Brighton. Le matin, j’aidais en cuisine, puis je changeais les draps et passais l’aspirateur sur les trois étages de l’hôtel.

Un matin (toujours froid et pluvieux), j’entrai dans la cuisine pour aider la propriétaire à préparer le petit-déjeuner. La radio diffusait "Lança Perfume". La dame chantonnait, heureuse. Je me mis à chanter en portugais, et elle me demanda de quoi parlait la chanson.

"It’s a couple making love", dis-je.

Surprise, elle soupira :

"Oh, dear."

Plus tard, lorsque nous déménageâmes en France, "Lança Perfume""Mania de Você", ainsi que les compositions de Chico Buarque, Jorge Ben Jor, Caetano Veloso et Gilberto Gil étaient régulièrement diffusées à la radio. C’était impressionnant de voir à quel point la musique brésilienne traversait les frontières. Aujourd’hui, MC Ryan semble loin d’y parvenir. Pour l’instant, il se limite au terrain du stade du 15 de Piracicaba.

En parlant de la France, j’ai lu "Changer : Méthode" d’Édouard Louis, jeune auteur de 32 ans, invité en octobre dernier dans l’émission "Roda Viva" sur TV Cultura. Dans son livre, il raconte tout ce qu’il a dû faire pour atteindre la célébrité et le succès : se prostituer, se rapprocher des gens par intérêt, se lier d’amitié avec des personnes pouvant lui être utiles. Victime d’homophobie et de harcèlement depuis l’enfance, l’auteur fut élevé dans une famille pauvre, où il passait des heures devant la télé. Sa mère fumait sans arrêt, et son père était un ouvrier sans culture. Le livre est étrange : bien qu’il semble chercher l’empathie du lecteur en racontant sa vie de souffrance, on finit par voir l’auteur comme un opportuniste, un arriviste.

C’est un récit de douleurs personnelles. Les jeunes appelleraient ça du "mi-mi-mi". Le livre aurait pu s’intituler "Mémoires d’un arriviste" ou "Souvenirs d’un opportuniste".

Et en parlant de pleurnicheries, les fans de Lady Gaga sont furieux contre la chanteuse, qui les a laissés littéralement "à voir des navires" devant le Copacabana Palace, où elle séjournait pour son concert devant 2 millions de spectateurs. Ils ne comprennent pas qu’elle les ait ignorés alors qu’ils montaient la garde devant l’hôtel, dans l’espoir fugace de l’apercevoir. Mais Lady Gaga n’a pas daigné apparaître. En revanche, à Singapour, où elle se trouve actuellement, elle s’est promenée dans les rues à la recherche de bière.

Cette idolâtrie envers une star fabriquée par l’industrie culturelle me rappelle mon adolescence. À 15 ans, j’avais tenté d’écrire une fiction. Mais un problème m’avait frappé : tous mes personnages imaginaires avaient des noms anglais – John, Steve, Maycon…

Cela m’a tellement perturbé que, des années plus tard, lorsque je préparai un projet de mémoire de master, je voulus travailler sur cette invasion culturelle, cette domination à laquelle nous sommes soumis. Mais à l’université, je me souviens d’un professeur secouant la tête et disant : "Non, non, choisis un autre sujet. Celui-là ne marchera pas."


  

      


terça-feira, 29 de abril de 2025

"Comida caseira"

 


Não sei qual é o apelo da comida caseira. Toda cidade desse "país de dimensões continentais", como dizia a revista "O Cruzeiro", ostenta um restaurante que oferece "comida caseira". Qual é a graça de sair de casa, enfrentar as vicissitudes do tempo, do perigo em cada esquina, e chegar em um restaurante que oferece a comida que você come em casa? Pra que tanto sacrifício? Fica em casa. Coma a sua comida caseira. Pronto. Mas não. As pessoas querem experimentar não o novo, nem o ousado, nem o inusitado. Elas querem comida caseira. Pra isso, elas cruzam os 8 milhões e 500 mil quilômetros desse Brasil brasileiro, em busca da mesma comida que eles provariam exatamente igual em suas cozinhas sem mover uma palha. É sempre arroz, feijão, bife, ovo, batata e salada, com milhares de alterações redundantes. Às vezes, trocam o bife pelo frango ou peixe. Mas a ideia é sempre a mesma. Nada muda. 

Na adolescência, os pequenos cafajestes, quando eram perguntados se iriam levar a namoradinha no baile, costumavam dizer: "Não levo sanduíche de mortadela em banquete", querendo dizer que a "comida caseira" necessitava de variação.  

Quando frequento um restaurante, olho o cardápio com o interesse de astrônomo em busca dos anéis de Saturno. Quero provar algo que nunca comi antes. Quero me surpreender. Que tal uma entrada de rúcula selvagem com queijo brie e azeite trufado? E salmão com aspargos e salpicos de pimenta rosa? Parece bom. Que tal um risoto de camarão ou de alho-poró para acompanhar? Que me diz de um filé mignon ao molho madeira com champignons? E de sobremesa? Que tal um crème brulée, aquele que o garçom queima na nossa frente com maçarico? 

Assim vale a pena ir a um restaurante. Agora, se você tem preguiça de fazer arroz, feijão, bife, ovo frito, batata frita e salada...Vou te contar uma coisa. Faça sinal para o técnico e peça para ser substituído.


 Um amigo meu indicou o filme "Cabrini", de 2024, direção de Alejandro Gómez Monteverde. Pensei que fosse uma produção sobre o talentoso repórter e apresentador Roberto Cabrini. Mas não. Era a história da vida da madre Cabrini (1850-1917), italiana, radicada nos Estados Unidos e a primeira santa canonizada, tendo vivido na América. O filme tem roteiro brilhante. Sai do A para o B. Depois vai para o C, D e assim por diante. Nada daqueles roteiros irritantes que misturam passado, presente e futuro, causando uma confusão danada na cabeça do editor e também na do coitado do público, que só quer se entreter por algum tempo, porque, se fosse pra prestar atenção, leria um livro. 

Esse amigo meu funciona assim: ele me indica um filme ou série; eu vejo e comento com ele. Quando é a minha vez de indicar um filme ou série para ele, o desgraçado não vê. Enfim, essa é a minha vida, acredite ou não. 

O filme "Cabrini" (será que ela era bisavó do Roberto Cabrini?) revela a luta de um freira para criar hospitais, asilos, escolas, tendo que superar o preconceito de padres, arcebispos, cardeais e até do próprio papa, sem esquecer dos políticos (vereadores, prefeito) e da elite nova-iorquina. O filme mostra que madre Cabrini era um trator. Ela passava por cima de todo mundo, em sua liturgia de criar uma rede mundial da esperança. Ela cuidou de órfãos, que viviam nas ruas de Nova York. Cavou poços. Recolheu prostitutas. Enfrentou cafetões. A mulher era uma rocha de firmeza de caráter. Sem dinheiro, expulsa da América por um arcebispo retrógado, ela entrou no Senado italiano e chamou os políticos na chincha. Enquanto os senadores faziam discursos vazios, ela interrompeu a verborragia para revelar a realidade miserável dos imigrantes italianos na América, que, segundo o "The New York Times", viviam pior que os ratos. Inabalável, madre Cabrini - que era tuberculosa - conseguiu retornar aos Estados Unidos, teve ajuda financeira para criar uma rede mundial de apoio aos necessitados (Brasil e China incluídos). Morreu aos 67 anos, em Chicago, e seu corpo foi sepultado em Nova York. O filme fala de uma freira que morreu em 1917 e mesmo assim é atualíssimo ao falar do preconceito que os imigrantes italianos, judeus, polacos, enfrentavam no novo continente. Hoje, os imigrantes odiados somos nós, os latinos, os africanos e os árabes. 

No papel principal, a atriz Cristiana Dell'Anna está impecável. O bom John Lithgow faz o prefeito de Nova York, o arcebispo é vivido por David Morse. O papa, interpretado por Giancarlo Giannini, de dezenas de filmes, entre eles "Pasqualino Sete Belezas", que lhe valeu indicação de melhor ator para o Oscar, em 1975.

Onde morei na infância e "giovinezza", ali perto, tinha um colégio de freiras, chamado Madre Cabrini. Nunca me contaram a história da madre. Mais imperdoável ainda: quando fiz faculdade de letras, a instituição funcionava no mesmo prédio do colégio Madre Cabrini, na rua Madre Cabrini, número 36. Durante o dia, as freiras ensinavam as meninas. À noite, era uma faculdade e os marmanjos ocupavam as salas de aula. Nunca, durante os três anos de letras, procurei saber quem tinha sido a madre famosa. Para você ter ideia de como a gente andava com a cabeça na época da Ditadura.


Por falar na Ditadura, a jornalista Eliane Catanhêde, com a empáfia pedante dos bem-nascidos, fez um longo comentário no canal GloboNews sobre o ex-presidente Fernando Collor de Mello. Ela lembrou o episódio em que Arnon, o pai de Collor, trocou tiros no Senado com seu colega Silvestre Péricles de Góis Monteiro. Arnon errou o alvo e matou o senador acreano José Kairala, que não tinha nada a ver com a rivalidade entre Arnon Collor e Silvestre Monteiro. Era o último dia de Kairala na Câmara Alta e estavam lá, como convidados, a mulher e os filhos de Kairala, que o viram ser assassinado.

Além desse episódio, Eliane Catanhêde relembrou a juventude de Collor, em Brasília, com suas namoradas lindas e maravilhosas, os carrões último tipo, sua vida de playboy. Contou que Collor gostava de humilhar os descamisados e fazer bullying com os fracos e oprimidos. Durante um jantar, regado a prata e cristais, Collor foi servido por uma empregadinha, vestida de empregadinha. Ele identificou um cabelo na comida. Chamou a serviçal e atirou toda a comida na cara da moça. Segundo Catanhêde, Collor não era um "caçador de marajás". Ele era um marajá.

Em 1989, durante a campanha para a Presidência da República, a Globo editou um debate entre Collor e Lula, influenciando diretamente a opinião pública a favor de Collor. Por ordem do publicitário e então todo poderoso global José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, Collor entrou para o debate, portando pastas que escondiam papéis em branco, apenas para sugerir que havia ali dentro denúncias gravíssimas contra Lula.  O então diretor de Jornalismo da Globo Armando Nogueira confirmou que houve mutreta na edição do debate, para favorecer Collor.

Hoje, Lula ocupa a Presidência e Collor é hóspede do presídio Baldomero Cavalcante de Oliveira, onde cumpre pena por corrupção e lavagem de dinheiro.    

E a história relatada pela comentarista política da Rede Globo Eliane Catanhêde chegou até nós somente com 36 anos de atraso. 

Homemade food

I don’t understand the appeal of homemade food. Every city in this “continent-sized country,” as the magazine “O Cruzeiro” used to say, boasts a restaurant offering “homemade food.” What’s the point of leaving your house, facing the vicissitudes of the weather, the danger on every corner, only to arrive at a restaurant serving the same food you eat at home? Why make all that sacrifice? Stay home. Eat your homemade food. Done. But no. People want to experience not the new, nor the bold, nor the unusual. They want homemade food. For that, they cross the 8.5 million kilometers of this Brazilian Brazil, in search of the same food they could eat exactly the same way in their own kitchens without lifting a finger. It’s always rice, beans, steak, eggs, potatoes, and salad, with thousands of redundant variations. Sometimes, they swap the steak for chicken or fish. But the idea is always the same. Nothing changes.

In adolescence, the little scoundrels, when asked if they were going to take their girlfriend to the dance, used to say: "I don't take a mortadella sandwich to a banquet," meaning that "homemade food" needed variety.

When I go to a restaurant, I look at the menu with the interest of an astronomer searching for Saturn’s rings. I want to try something I’ve never had before. I want to be surprised. How about a starter of wild arugula with brie cheese and truffle oil? And salmon with asparagus and pink peppercorns? Sounds good. How about a shrimp risotto or a leek risotto to go with that? What about a filet mignon with madeira sauce and mushrooms? And for dessert? How about crème brûlée, the kind the waiter torches in front of us with a blowtorch?

Now that’s worth going to a restaurant for. But if you’re too lazy to make rice, beans, steak, fried eggs, French fries, and salad... Let me tell you something. Signal to the coach and ask to be substituted.

A friend of mine recommended the movie Cabrini (2024), directed by Alejandro Gómez Monteverde. I thought it was a production about the talented reporter and presenter Roberto Cabrini. But no, it was the story of Mother Cabrini's life (1850-1917), an Italian who settled in the United States and became the first saint to be canonized after having lived in America. The film has a brilliant script. It moves from A to B, then goes to C, D, and so on. None of those annoying scripts that mix past, present, and future, creating a mess in the editor's head and also in the poor audience's head, who just want to be entertained for a while, because if they wanted to pay attention, they'd read a book.

This friend of mine works like this: he recommends a movie or series to me; I watch it and comment with him. When it’s my turn to recommend a movie or series to him, the bastard doesn’t watch it. Anyway, that’s my life, believe it or not.

The film Cabrini (I wonder if she was Roberto Cabrini's great-grandmother?) reveals the struggle of a nun to build hospitals, orphanages, and schools, overcoming prejudice from priests, archbishops, cardinals, and even the pope himself, not to mention politicians (city council members, mayors) and the New York elite. The film shows that Mother Cabrini was a bulldozer. She ran over everyone in her mission to create a global network of hope. She took care of orphans living in the streets of New York. She dug wells. She took in prostitutes. She fought pimps. The woman was a rock of steadfast character. Without money, expelled from America by a backward archbishop, she went to the Italian Senate and called the politicians out. While the senators gave empty speeches, she interrupted their blabbering to reveal the miserable reality of the Italian immigrants in America, who, according to The New York Times, lived worse than rats. Unshaken, Mother Cabrini—who had tuberculosis—managed to return to the United States, received financial help to create a worldwide network of support for the needy (including Brazil and China). She died at 67 in Chicago, and her body was buried in New York. The film tells the story of a nun who died in 1917 but is still highly relevant today in addressing the prejudice that Italian, Jewish, and Polish immigrants faced in the New World. Today, the hated immigrants are us: Latinos, Africans, and Arabs.

In the lead role, actress Cristiana Dell'Anna is impeccable. The great John Lithgow plays the mayor of New York, and the archbishop is portrayed by David Morse. The pope is played by Giancarlo Giannini, who has appeared in dozens of films, including Pasqualino Sette Bellezze, for which he was nominated for an Academy Award for Best Actor in 1975.

Where I lived during my childhood and "giovinezza," there was a convent school nearby called Madre Cabrini. No one ever told me the story of the mother. Even more unforgivable: when I went to college for literature, the institution was in the same building as the Madre Cabrini school, on Madre Cabrini Street, number 36. During the day, the nuns taught the girls. At night, it was a college, and the grown men anda women occupied the classrooms. Never, during my three years in literature, did I try to learn who the famous mother was. To give you an idea of what was going on in our minds back in the days of the Dictatorship.

Speaking of the dictatorship, journalist Eliane Catanhêde, with the pedantic arrogance of the well-born, made a lengthy commentary on the GloboNews channel about former president Fernando Collor de Mello. She recalled the incident when Arnon, Collor’s father, exchanged gunfire in the Senate with his colleague Silvestre Péricles de Góis Monteiro. Arnon missed his target and killed Senator José Kairala from Acre, who had nothing to do with the rivalry between Arnon Collor and Silvestre Monteiro. It was Kairala’s last day in the Senate, and there, as guests, were his wife and children, who witnessed him being murdered. In addition to this episode, Eliane Catanhêde remembered Collor's youth in Brasília, with his beautiful and wonderful girlfriends, his top-of-the-line cars, his playboy lifestyle. She told that Collor liked to humiliate the poor and bully the weak and oppressed. During a dinner, accompanied by silver and crystal, Collor was served by a maid, dressed as a maid. He found a hair in the food. He called the maid and threw all the food in her face. According to Catanhêde, Collor was not a "hunter of marajás" (corrupt elites). He was a marajá himself.

In 1989, during the campaign for the Presidency, Globo edited a debate between Collor and Lula, directly influencing public opinion in favor of Collor. By order of the advertising mogul and then all-powerful Globo executive José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, known as Boni, Collor entered the debate carrying folders that concealed blank papers, just to suggest that they contained grave accusations against Lula. The then Globo News Director Armando Nogueira confirmed that there was manipulation in the debate’s editing to favor Collor.

Today, Lula occupies the Presidency, and Collor is a guest at the Baldomero Cavalcante de Oliveira prison, where he serves time for corruption and money laundering.

And the story relayed by political commentator Eliane Catanhêde on Globo News only reached us 36 years later.

   

Humorista Leo Lins é censurado pela Justiça Federal

  Leonardo de Lima Borges Lins, o humorista condenado O início é óbvio: Constituição da República Federativa do Brasil, artigo 5º, que trata...