segunda-feira, 29 de julho de 2024

Ho Chi Minh e as narradoras de futebol

 


Ho Chi Minh disse uma vez que metade da sociedade humana é

formada por mulheres. Por isso, elas merecem ter direitos iguais aos 

homens. Ho Chi Minh era comuna. Morreu antes de assistir à 

debacle norte-americana no Vietnã. Não viu os últimos helicópteros 

dos Estados Unidos fugindo da embaixada, carregando os últimos 

refugiados, enquanto os vietcongues ocupavam definitivamente 

Saigon.

Concordo com Ho Chi Minh. As mulheres devem ter mesmo todos os direitos iguais aos homens. Com uma única exceção: elas deveriam abrir mão de narrar jogos de futebol.

Um dos meus derradeiros prazeres sobre o planeta é assistir futebol.

 Se bem que tenho visto mais jogos ruins do que memoráveis. 

Na realidade, são raros os craques, são raras as jogadas de efeito, são

 escassos os momentos de alegria e prazer vindos do futebol atual.

Sem craques, sem partidas inesquecíveis, o apaixonado pelo futebol 

precisa caçar, aqui e ali, para tentar encontrar uma partida que 

mereça ser assistida. Quando isso acontece, em muitos casos, quem 

está narrando é uma moça. O jogo está morno como leite esquecido 

no micro-ondas. Mas ela grita. Grita muito, tentando imprimir 

emoção a jogadas banais. A bola é chutada bem lá em cima e a moça 

usa toda a força da garganta para informar o óbvio: a bola não 

alcançou o alvo. Longe disso. Bem longe.


Antes de morrer, o locutor Silvio Luiz declarou, em uma entrevista, 

que mudava de canal, quando o jogo era narrado por uma mulher. 

Silvio Luiz foi um dos melhores narradores de futebol. Tinha 

bordões divertidos (“olho no lance”). Homenageava locutores do 

passado. Com seu estilo personalíssimo, nunca foi cogitado para 

trabalhar na Rede Globo. Em 1982, durante a Copa, a Record não 

tinha os direitos de transmissão. A emissora então apostou em Silvio 

Luiz. A propaganda pedia para o público ligar a TV na Rede Globo, 

desligar o som e ligar na Rádio Record, para ouvir a narração de 

Silvio Luiz. Foi um sucesso imenso. Na época, durante os protestos

contra a Ditadura Militar, os manifestantes gritavam nas ruas: “o povo não é bobo, fora Rede Globo”. O público associava a Globo ao regime militar (na prática, a emissora fazia o papel de relações públicas do regime de exceção) e por isso participava com prazer no boicote aos narradores globais.

No fim da vida, Silvio Luiz percorreu caminho inverso. Saiu da  

faixa guerrilheira e optou por rejeitar as mulheres narradoras.

De minha parte, acredito que mais narradoras irão surgir e entre as 

próximas estrelas haverá mais diversão e menos gritos. Vou dar boas 

risadas com os bordões, com as sacadas e vida que segue.

Tomara que o mesmo aconteça com o futebol. A primeira medida 

urgente seria impedir a exportação de craques infantis, adolescentes 

e com idade de servir o Exército. O craque aparece. A torcida se 

inflama. Aprende o nome dele. Começa a gritar na arquibancada e – 

de repente, não mais que de repente – o garoto está em Madri, sendo 

apresentado pelo presidente do clube bilionário.

Pode isso, Arnaldo? 


terça-feira, 9 de julho de 2024

O manifesto lésbico da série Deadloch

 

Série australiana foi vista por milhões e terá agora uma segunda temporada

Estreou em 2023 pelo streaming (Prime). Fez sucesso e, conforme foi anunciado hoje, vem aí mais uma temporada. É "Deadloch", a série australiana, escrita por duas Kates: Kate McCartney, 43 anos, e Kate McLennan, 44 anos. McCartney é noiva da militante LGBT+ Sally Rugg; e McLennan vive com Joel Elbourne, com quem teve uma filha. 

"Deadloch" brinca com a expressão inglesa "deadlock", que significa impasse, quando os processos jurídicos não podem ir para a frente. A história se passa em uma cidadezinha da Tasmânia (ilha situada na costa sul da Austrália), chamada "Deadloch". Duas detetives investigam mortes de homens brancos e héteros. Uma das detetives é certinha e segue o manual. A outra cria suas próprias regras e não segue qualquer manual. 

A exemplo da série estrelada por Jodie Foster, na quarta temporada de "True Detective", os homens retratados nos episódios de "Deadloch" são grotescos, inúteis, agressivos, ingênuos, bêbados, falsos e sabe-se lá mais quantos adjetivos pejorativos a gente poderia elencar. Não há em "Deadloch" um único homem decente, em quem a gente poderia chamar para ser padrinho do nosso casamento. 

A figura masculina mais simpática, gentil, empática e colaboradora é homossexual. Os homens héteros, que detêm o comando, são absolutamente incompetentes e só atrapalham a investigação das duas detetives. 

O pior desempenho fica por conta de Madeleine Sami que vive a detetive maluquete "Eddie Rdcliffe". No papel de uma policial boca-suja, mal vestida, sem modos, de temperamento irascível, ela é o protótipo da caricatura. Não convence.

Muito melhor está Kate Box, fazendo a policial certinha "Dulcie Collins". Ela parece mesmo uma detetive ciente de seus deveres, a todo momento atrapalhada pela equipe, que parece mais preocupada com detalhes inúteis e corriqueiros do cotidiano do que com a investigação propriamente dita.

Na série, a doidinha "Eddie" é hétero; e a dedicada "Dulcie", lésbica. "Dulcie" é casada com uma militante do bem-estar, envolvida em cruzadas do politicamente correto. Provavelmente, muito do personagem de "Dulcie" deve ter sido inspirado na vida da autora Kate McCartney, que, como foi dito acima, é casada com uma militante LGBT+. 

Os diálogos entre as duas esposas evocam a dificuldade crescente de se manter uma relacionamento matrimonial estável, seja ele lésbico, hétero, trisal etc. As duas se amam, mas, como brigavam muito, quando viviam em Melbourne (no continente australiano), decidem se deslocar por cerca de 500 quilômetros e refazer a vida em uma vilarejo da Tasmânia. 

O ponto alto da série são as brigas do casal "Dulcie" e "Cath" (Alicia Gardiner). "Dulcie" ama a profissão e quer continuar na carreira de detetive, mas a esposa "Cath", que é veterinária, advogada, cozinheira e pau pra toda obra, sente ciúmes da profissão da companheira e tenta podá-la, o que deixa nervos expostos na relação da duas. 

Para atrair a atenção de turistas, a prefeita de "Deadloch" cria atrações diversas, a maioria voltada para o público LBGT+, o que transforma o vilarejo em uma sucursal da Ilha de Lesbos. 

Em meio à diversidade de gênero, vivem os locais - os aborígenes - expulsos de suas terras e relegados a trabalhos de servidão, o que provoca revolta e animosidade cívica. Situação muito semelhante à exposta em "True Detective 4". No caso da série estrelada por Jodie Foster, os esquimós são os excluídos, em busca de vingança.

"Deadloch" tem oito episódios. Apesar da péssima interpretação de Madeleine Sami, o suspense até acontece. O enredo sugere um manifesto lésbico-feminista, mas é possível assistir a primeira temporada com olhar beneplácito. 

Em inglês:

"The lesbian manifesto of the Deadloch series"

It premiered in 2023 on streaming (Prime). It was a success, and as announced today, another season is on the way. It’s Deadloch, the Australian series written by two Kates: Kate McCartney, 43, and Kate McLennan, 44. McCartney is engaged to LGBT+ activist Sally Rugg, and McLennan lives with Joel Elbourne, with whom she has a daughter.


Deadloch plays on the English expression "deadlock," which means a stalemate, when legal processes cannot move forward. The story takes place in a small town in Tasmania (an island off the southern coast of Australia) called Deadloch. Two detectives investigate the deaths of white, heterosexual men. One of the detectives is by-the-book and follows the manual. The other creates her own rules and doesn’t follow any manual.


Similar to the series starring Jodie Foster in the fourth season of True Detective, the men portrayed in Deadloch are grotesque, useless, aggressive, naive, drunk, fake, and who knows how many other pejorative adjectives we could list. There isn’t a single decent man in Deadloch whom you could call to be the best man at your wedding.


The most likable, kind, empathetic, and cooperative male figure is homosexual. The heterosexual men in charge are utterly incompetent and only hinder the investigation carried out by the two detectives.

The worst performance comes from Madeleine Sami, who plays the quirky detective "Eddie Redcliffe." In the role of a foul-mouthed, poorly dressed, ill-mannered, and hot-tempered police officer, she is the epitome of a caricature. She fails to convince.


Much better is Kate Box, playing the by-the-book officer "Dulcie Collins." She truly seems like a detective aware of her duties, constantly hindered by her team, which seems more concerned with useless and mundane daily details than with the investigation itself.

In the series, the quirky "Eddie" is heterosexual, and the dedicated "Dulcie" is a lesbian. "Dulcie" is married to a wellness activist involved in politically correct crusades. Likely, much of "Dulcie’s" character was inspired by the life of writer Kate McCartney, who, as mentioned above, is married to an LGBT+ activist.


The dialogues between the two wives highlight the growing difficulty of maintaining a stable marital relationship, whether lesbian, heterosexual, throuple etc. They love each other, but because they fought so much while living in Melbourne (on the Australian mainland), they decided to move about 500 kilometers away and start over in a small village in Tasmania.


The highlight of the series is the fights between the couple "Dulcie" and "Cath" (Alicia Gardiner). "Dulcie" loves her job and wants to continue her career as a detective, but her wife "Cath," who is a veterinarian, lawyer, cook, and jack-of-all-trades, feels jealous of her partner’s profession and tries to curb it, which exposes raw nerves in their relationship.


To attract tourists, the mayor of Deadloch creates various attractions, mostly aimed at the LGBT+ audience, turning the village into a branch of the Isle of Lesbos.


Amid the gender diversity, the locals—the Aboriginal people—live expelled from their lands and relegated to servile work, which provokes outrage and civic animosity. A situation very similar to that depicted in True Detective 4. In the series starring Jodie Foster, the Inuit are the excluded ones, seeking revenge.

Deadloch has eight episodes. Despite Madeleine Sami’s poor performance, the suspense does work. The plot suggests a lesbian-feminist manifesto, but it’s possible to watch the first season with a benevolent eye.     

  

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