sexta-feira, 24 de março de 2023

TV Tem tem pouca notícia e muito serviço


A TV Tem é uma afiliada da Rede Globo. Foi criada, há 20 anos, por J.Hawilla, da empresa Traffic, e hoje é presidida pelo filho do seu fundador, Stéfano Hawilla. 

J.Hawilla ganhou notoriedade mundial ao ser delator do escândalo de corrupção da Fifa. Ficou cinco anos preso nos Estados Unidos. Voltou ao Brasil onde morreu de câncer, em maio de 2018.

A TV Tem, com  seus telejornais, cobre o interior do Estado de São Paulo. Traz notícias, principalmente, de Bauru, São José do Rio Preto, Sorocaba. 

O pauteiro da TV Tem, ou seja, aquele sujeito que define o que vai ser notícia, é preguiçoso ou tem pouquíssima margem de manobra jornalística. Talvez faltem recursos. Talvez tenha poucos jornalistas. O fato é que o noticiário da TV Tem é um servição.

Acredito que 90% do conteúdo de seus telejornais sejam serviço: buraco, rua interrompida, vacinação e milhares de horas devotadas a vagas em cursos do Sest Senat, Sebrae, entre outros. Não há uma única reportagem exclusiva, furo de reportagem, jornalismo investigativo.

A cobertura das câmaras municipais e das prefeituras só desperta o público, quando alguém está sendo alvo de impeachment. No mais, parece que todos os prefeitos e todos os vereadores estão se comportando direitinho. Não há máculas a serem investigadas. 

E dá-lhe serviço: a principal rua de Bauru está sendo recapeada então o motorista deve usar a via paralela. Para dar essa informação, o repórter ficou cerca de cinco minutos falando sem parar. Descreveu em pormenores o trecho da rua sendo asfaltada e as opções de quem vem de determinado bairro para ir a outro local. Em 30 segundos, seria possível informar que a rua está bloqueada e uma arte poderia dar melhor ideia ao telespectador. Mas, quem sabe, não haja verba para arte.

Essa disposição do repórter do telejornal falar muito é fenômeno recente. Antes, o jornalista aparecia por cerca de 30 segundos a um minuto. Provavelmente, as equipes estejam reduzidas, por isso, cada repórter tem um tempo extraordinário, em televisão, para contar o que está acontecendo.

No telejornal matutino Bom dia São Paulo, da TV Globo, a mesma verborragia está presente em notícias que não teriam a menor necessidade de serem aprofundadas. 

Caiu uma árvore na rua. Pronto: lá vai a repórter, descrever que o vento forte derrubou a árvore, que a árvore caiu na rua e que impediu o trânsito de veículos, e que chegou a equipe da prefeitura que fará a remoção do tronco e dos galhos, porque a árvore caiu por causa da chuva e lá vai a repórter falando sem parar, por cerca de cinco minutos ou mais. A notícia não tem a menor importância, a não ser para os coitados que moram naquela artéria e não vão poder trafegar, enquanto a árvore não tiver sido removida. 

Há pelo menos duas repórteres que falam com a mesma velocidade de um Fórmula 1. Elas ligam o acelerador e vão em frente. Fico maravilhado ao ver como elas conseguem discorrer sem parar, sem pausa até para respirar, sobre assuntos corriqueiros, como descarte irregular de entulho. A repórter percorre o monte de entulho. Relata tudo que foi ali atirado naquele monturo e que ninguém da prefeitura apareceu para retirar a sujeira. E fala, fala, fala incansavelmente. É um tipo de jornalismo maratonesco. Ainda bem que a gente está tomando café forte, senão voltaríamos a dormir.

Em comemoração a seus 20 anos, a TV Tem tem percorrido as cidades do interior. Dois âncoras ficam postados em uma praça, rodeados por um bando de gente, disposta a aplaudir tudo que for dito ali. É algo tão constrangedor, tão pouco profissional, tão distante de qualquer prática jornalística de influência, que dá até vergonha de assistir.

Sinceramente, o que me interessa saber o que os âncoras da TV Tem estejam fazendo na praça principal de Pardinho? E o pessoal bate palmas, grita, comemora. É uma lástima.

As apresentadoras da TV Tem parecem ter saído todas da mesma forma. São mulheres na faixa dos 30 anos, morenas, tem o cabelo cortado na altura dos ombros. Vestem-se de forma conservadora, como uma senhora inglesa interiorana, saindo de casa para ir à paróquia jogar bingo.

Os cenários são pouco chamativos e, para dizer a verdade, entediantes. 

Para encerrar a análise, jornalismo de serviço deveria preencher no máximo 30 por cento da programação de um telejornal. É importante saber que começou determinada campanha de vacinação e que esta e aquela prefeitura abriram concursos para contratação de pessoal.

O restante da programação deveria estar voltada para "hard news" e noticiário exclusivo, furos de reportagem. São milhares de assuntos a ser explorados: uso (e abuso) de carros oficiais, atuação de empreiteiras (corrupção?), devastação ambiental, saúde (filas em atendimento), má conservação de escolas, qualidade de merenda escola, ocorrências policiais, o estado das estradas vicinais, com obras atrasadas e intermináveis. Enfim, notícias não faltam. O que falta é vontade jornalística para levá-las a quem de direito.           

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