Sou ouvinte regular, nem sempre fiel, da Band News FM. Por volta de 7h15, Reinaldo Azevedo dá o ar da graça e inicia sua metralhadora giratória. O estilo é parecido com o de Francis. Alinha uma série de argumentos e fatos, nomes e citações filosóficas, curvas e retas, chutes e caneladas, busca sempre surpreender o ouvinte, de tal maneira que você não sabe se ele está falando contra ou a favor. Vai e volta. Recarrega a metralhadora. Dispara, dispara e dispara.
Depois de ouvi-lo durante toda esta semana, cheguei a uma conclusão brilhante: o presidente Michel Temer tem um defensor inabalável, fiel, destemido, corajoso, irritado. Ele defende tanto o presidente Michel Temer, mas defende com tantas unhas e garras que a gente chega a confundir isso com uma coisa, assim, amorosa. Parece a defesa de um marido apaixonado, que não se conforma com o amigo que vai contar para ele que a esposa está tendo um caso.
Eu não saberia repetir aqui os argumentos de Reinaldo Azevedo, em defesa do presidente Michel Temer, porque Reinaldo é um senhor inteligentíssimo, dotado de uma cultura sobrenatural. Acredito que ele está dizendo, mais ou menos, o seguinte: "O presidente Michel Temer é o político mais honesto do Brasil. O presidente Michel Temer nunca derramou café na gravata. O presidente Michel Temer está sendo alvo de gente malvada, como esses procuradores da República, que só querem enlamear o nome cândido, imaculado, do nosso querido representante político máximo".
O pobre do procurador Rodrigo Janot, antes de deixar de usar bambu para fazer flecha, sofreu igual Cristo na cruz nas mãos (ou na boca) de Reinaldo Azevedo. O jornalista chamou Janot de "cadáver adiado que procria". As denúncias dele eram uma "ruindade assombrosa". O procurador "vomitava totalitarismo". As ações de Janot eram "patuscadas". Acho que Reinaldo chegou a chamar Janot até de "feiticeiro", se não me falha a memória falha.
Tive o prazer de trabalhar lado a lado, ombro a ombro, beiço a beiço, com Reinaldo Azevedo. Isso aconteceu na Redação do Diário do Grande ABC. Em janeiro de 1994, o presidente do Sindicato dos Condutores Rodoviários do ABCD, Oswaldo Cruz Júnior, foi assassinado em Santo André.
O suposto assassino José Benedito de Souza, o Zezé, teria cometido o crime. Mas por qual motivo?
Na hora de fazer a manchete, Reinaldo Azevedo - que o pessoal da Redação chamava carinhosamente de Piu-Piu (não sei por quê) - mandou bala em cima do PT: "Morte é queima de arquivo". Foi a manchete do Diário do Grande ABC.
No entender de Reinaldo Azevedo e de um repórter do DGABC que havia sido excomungado do PT, a morte de Oswaldo teria sido encomendada pelo Partido dos Trabalhadores, por causa de denúncias contra a CUT e o próprio PT.
Reinaldo não quis nem ouvir a versão de um repórter policial investigativo que garantia que a morte de Oswaldão (como o dirigente sindical era conhecido) tinha um ingrediente menos político e mais prosaico: dinheiro. Oswaldão havia cortado uma mamata que rendia uns trocados a Zezé, que, revoltado, despachou o presidente do Sindicato ao encontro de Jesus.
Não se foi coincidência, mas pouco depois desse episódio, Reinaldo Azevedo foi defenestrado da Redação do DGABC e liberado para conquistar o mundo e os microfones da Band News FM.
Esse episódio turvo, complexo, equivocado, que aconteceu a poucos passos da minha pessoa, me fez entender o seguinte: renascia ali uma nova geração de lacerdistas, jornalistas a serviço de um partido, de uma ideologia e de si mesmos. Os novos lacerdistas não fariam oposição ao cadáver de Getúlio Vargas, mas iriam mirar no Partido dos Trabalhadores e seus asseclas até expurgá-los do poder para todo o sempre.
Já os leitores, os ouvintes, os telespectadores, em busca de uma opinião menos parcial e menos partidária, aquilo que nas faculdades de jornalismo a gente chamava de "imparcialidade", estariam no mato sem cachorro dali em diante. Por falar nisso, é onde parece que estamos todos nós neste exato momento.
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