terça-feira, 19 de setembro de 2017

San Junipero - a eternidade insuportável


A mídia jogou os holofotes sobre a recente premiação do Emmy Awards (um desses prêmios que injeta divulgação nos produtos norte-americanos de entretenimento). Para deleite quase majoritário, o filme San Junipero da 3ª temporada de Black Mirror saiu com duas premiações: melhor filme feito para TV e melhor roteiro e minissérie.


As atrizes Gugu Mbatha-Raw e Mackenzie Davis, que fazem o par romântico do episódio, posaram felizes com seus vestidos de gala. Mackenzie, que tem nome de instituição de ensino direitista da rua da Consolação, usava um tomara-que-caia verde e branco que combinava mal com os sapatos de salto alto rosa choque.

O roteiro de San Junipero é atraente por ocultar por uma meia hora o que está por trás do romance entre as duas garotas. Gugu, que tem nome de apresentador de TV, é a extrovertida Kelly que sai na noite para se divertir com homens e mulheres. Mackenzie é a introvertida Yorkie, que sente atração por mulheres, mas não consegue sair do armário.

Na meia hora seguinte, vamos descobrir a "verdade": Kelly é uma idosa com pouco tempo de vida, que vive em um asilo. E Yorkie, que tem nome de raça de cachorro, está em estado terminal, depois de passar a vida em uma cama por ser tetraplégica. As duas garotas, que iniciam um romance e se encontram na noite da cidade imaginária de San Junipero, na realidade não existem. Seriam dois avatares, dois seres imaginários vivendo uma realidade virtual em uma cidade igualmente virtual.

Para ter acesso à realidade virtual e criar seus avatares, as velhinhas têm uma espécie de botão branco iluminado que é colocado na lateral da fronte. Quando o botãozinho é acionado, elas mergulham no mundo virtual e se transformam em jovens novamente com toda a vida pela frente.

O problema aparece quando as duas se submetem à eutanásia. O roteiro não explica como, mas as duas personagens virtuais, os dois avatares, continuam existindo na cidade imaginária de San Junipero, mesmo após a morte de suas "existências reais".

Saudades do tempo em que Hades, irmão de Zeus, governava o reino do submundo e impedia os mortos de saírem das sombras para apavorar os vivos. 

Os dois avatares são jovens, felizes, se amam e foram condenados a ser felizes para sempre. Quem controlaria e existência desse mundo imaginário seria uma central de computadores, movida a robôs. É uma Matrix com final feliz.

Imagine você sendo obrigado a viver feliz e apaixonado por toda a eternidade? A cidadezinha virtual só tem gente contente, de bem com a vida. Não tem sem-teto, não tem doente na porta de hospital, não tem fila de ônibus, não tem metrô quebrado e trem atrasado. Não tem um infeliz que esteja de mal com a vida, querendo arrumar encrenca com o motorista do carro ao lado.

Enfim, o premiado San Junipero é mais uma bobagem, que faz a gente gastar nosso precioso tempo, enquanto o 1% continua mandando ver, sem nenhum perdão, em cima da gente, os 99%.            

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